Considerado um dos maiores atores da história do teatro e da televisão brasileira, Raul Cortez morreu em julho de 2006. Dono de grandes personagens em novelas, ele tinha uma vida reservada fora da telinha, mas não se poupava em deixar muitos fatos bem claros.

Confira abaixo 10 curiosidades sobre a vida e a carreira do ator, que pode ser visto novamente na reprise de O Rei do Gado no Vale a Pena Ver de Novo.

Rejeição

O início de carreira de Raul Cortez não foi fácil. Ele foi rejeitado pela família após decidir seguir no teatro – todos queriam vê-lo advogado. Seu pai nunca foi vê-lo atuar. Além disso, foi marginalizado pela classe teatral, que não aceitava um “filhinho de papai” entre eles.

Quando estreou nos palcos, em 1956, na peça Eurídice, o crítico paulista Décio de Almeida Prado disparou:

“Raul Cortez não merece um lugar no teatro brasileiro”.

Maria-mole com groselha

À Veja, em fevereiro de 1980, o ator contou que passou muitos perrengues no início da carreira.

“Vivia num apartamento da alameda Lorena, em São Paulo, comendo banana, mingau e aveia. Sem dinheiro, desempregado, escapou da inanição graças ao zelo da mãe, dona Conceição, que todas as tardes mandava um motorista com o almoço de Santo Amaro. À noite, sonhava com doses de Maria-Mole com Groselha, uma louca mistura de Mandrix, cocaína e maconha”, destacou a revista.

“Estive assim até perceber que era esse o comportamento que o sistema permitia ao ator. Então fiquei inteiramente careta”, explicou.

Comunismo

Em 1963, o ator resolveu entrar para o Partido Comunista. No entanto, de acordo com a matéria da Veja de fevereiro de 1980, ele foi rejeitado pelo PC, “acusado de burguês e homossexual”.

Fama tardia

Apesar de já ser considerado um grande nome do teatro e ter feito diversas novelas na TV Tupi nos anos 1970, Raul Cortez só foi nacionalmente reconhecido quando, aos 48 anos, viveu o médico Miguel Fragonard em Água Viva, trama exibida pela Globo em 1980. O fenômeno foi tão grande que ele foi capa da revista Veja naquele ano. A reportagem destacou que, enfim, o ator seria popular.

“A novela foi um sucesso absolutamente incrível e eu nunca mais tive problemas pelo fato de ser careca”, contou o ator à revista Istoé Gente de 21 de dezembro de 2000.

Bissexual

Em entrevista à revista Veja em 1980, Raul Cortez falou sobre sua bissexualidade, numa época em que o tema ainda era um tabu.

“Atração é uma coisa que está no ar. Ninguém pode impor que a gente vá gostar só de homens ou transar só com mulheres”, declarou.

Ele foi casado duas vezes, com a atriz Célia Helena (foto acima) e com a modelo Tânia Caldas. Teve duas filhas, Lígia, também atriz, e Maria.

Era contra novelas

Por muitos anos, Cortez foi avesso a participar de novelas.

“Eu sou o exemplo vivo desse preconceito. Só entrei na televisão nos anos 80. Até então, eu me recusava a fazer novela. Na época do governo militar, eu achava que a novela servia de doping, ao contrário do teatro, que tinha a função do engajamento. Costumava dizer que era um ator que não vendia sabonete. Mas a crise econômica atrapalhou e, como a novela passou a fazer parte do cotidiano das pessoas e a ser muito bem produzida, entrei para o veículo. Mas o teatro continua sendo o lugar em que o ator dá o melhor de si. Qualquer ator se encontra mais no teatro, no palco. Há o ritual, a magia que não existe na televisão”, contou ao JB.

Sua primeira presença foi em Ninguém Crê em Mim (1966), da TV Excelsior. No entanto, até o início dos anos 1980, realmente teve poucas participações no gênero, sempre na TV Tupi.

Gostava dos vilões

Na minissérie A, E, I, O… Urca, que a Globo exibiu em 1990, Raul Cortez viveu seu primeiro grande vilão em produções da Globo – e ele estava querendo isso há muito tempo.

“Os personagens ricos acabaram ficando chatos. Já os maus, os marginais, os neuróticos, os desajustados, ah, estes são os iluminados”, declarou ao jornal O Globo de 11 de junho de 1989.

Posteriormente, Cortez fez outro vilão memorável: Virgílio Assunção, no remake de Mulheres de Areia (1993).

Crise de idade

Em 1991, quando estava para completar 55 anos, o ator admitiu que sofria crises por conta do envelhecimento.

“Acho que todo homem, quando chega aos 50 – e eu estou para completar 55 – atravessa uma crise muito grande, da mesma forma a mulher quando chega à menopausa. Tenho essa consciência e a vivencio, mas não posso falar sobre ela, por ser algo que vou resolvendo à medida em que vou sentindo. Não é das coisas mais agradáveis da vida, mas tem momentos de uma excepcional beleza devido à maturidade”, declarou ao jornal O Globo de 21 de julho de 1991.

Em 1993, à mesma publicação, o problema parecia estar resolvido.

“Não vejo problema em falar sobre isso. Só não quero pegar a grave doença de querer parecer mais jovem. Não me preocupo de aparentar menos do que tenho”, enfatizou.

“No meu aniversário, tive uma crise e não quis comemorar a data. Estava em Veneza, passei a madrugada toda pensando se devia ou não assumir a idade, andando de um lado para o outro sobre uma linha na praça de São Marcos. Aí lembrei que sempre assumi tudo na minha vida e decidi assumir isso também. Consegui superar a crise”, completou.

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Barba branca

Raul se surpreendeu em 1996, quando viveu o inesquecível Geremias Berdinazzi, de O Rei do Gado.

“A grande surpresa que tive na composição deste personagem foi ter deixado a barba crescer, o que não faço nunca, e ela ter vindo branca”, contou ao Jornal do Brasil de 14 de setembro de 1996.

Além disso, contou que recebia como elogio quando alguém dizia que o personagem parecia ser bem mais velho do que ele.

O que aconteceu com Raul Cortez?

A última novela do ator foi Senhora do Destino, entre 2004 e 2005. Em dezembro de 2004, Cortez foi operado para a remoção de um tumor na região do pâncreas e do intestino delgado e teve que se ausentar da novela.

O autor Aguinaldo Silva foi obrigado a fazer mudanças nos capítulos, inserindo uma viagem para o Barão de Bonsucesso, papel do ator, para cuidar de um irmão acidentado no Mato Grosso. Com isso, ficou prejudicada a trama da descoberta do Alzheimer por parte de sua esposa, a Baronesa Laura (Glória Menezes), e o mordomo Alfred, vivido por Ítalo Rossi, acabou ganhando destaque.

Liberado pelos médicos para poucas cenas, Cortez gravou rápidos diálogos do jardim de sua casa, para serem usados como se falasse ao telefone com Laura. Em janeiro, após o emocionante reencontro do Barão e sua esposa, os dois gravaram suas últimas cenas na produção, fazendo uma viagem à Europa sem previsão de volta.

Após participar da minissérie JK, Cortez foi internado novamente em 30 de junho de 2006, vindo a falecer em 18 de julho de 2006, aos 73 anos.

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