Quando tentou inovar em seu principal horário de novelas, o das oito (atualmente das nove), na maioria das vezes a Globo não se deu bem. São inúmeras tramas e os mais diversos motivos: Espelho Mágico (1977), que mostrava os bastidores da produção de uma novela e de uma peça de teatro, e Rainha da Sucata (1990), que começou muito puxada no lado humorístico, são dois exemplos.

Rainha da Sucata ainda conseguiu se recuperar: passou de chanchada a dramalhão e terminou com sucesso. Na novela seguinte, Meu Bem, Meu Mal, que estreava há 31 anos, em 29 de outubro de 1990, a emissora voltou a apostar no modelo tradicional de trama, com mocinhos e vilões bem definidos e um mar de intrigas, paixão e ódio.

Em reportagem de Sônia Apolinário na Folha de S. Paulo de 28 de outubro de 1990, o próprio autor de Meu Bem, Meu Mal, o veterano Cassiano Gabus Mendes (1929-1993), definia bem a história: “uma novela tradicional, sem loucurinhas”, galgada no “jeito Janete Clair de ser”. “O público desse horário gosta de coisas mais sérias”, completou.

O próprio Gabus Mendes, ao lado de Silvio de Abreu, autor de Rainha da Sucata, são considerados, até hoje, os reis do horário das sete, com várias tramas que fizeram sucesso no horário, principalmente nos anos 1980.

E Abreu, em seu primeiro desafio às oito, teve que fazer alterações na estrutura da trama. A partir de junho de 1990, sua novela carregou no drama e viu a audiência crescer de 59% para 63% em São Paulo – para completar, ainda era época de Pantanal na Manchete, mas as duas não concorriam.

A matéria também contou que Meu Bem, Meu Mal foi escrita às pressas. A substituta de Rainha da Sucata originalmente seria Araponga, de Dias Gomes, também com muito humor na trama e que acabou sendo usada pela Globo para tentar frear o ímpeto da trama de Benedito Ruy Barbosa – não deu certo.

A Globo encomendou, basicamente, uma história de amor, que começou a ser feita em agosto de 1990. “Não tive muito tempo para pensar. Vou me basear mais no folhetim e atacar o problema do amor que está meio fora das telas”, disse Gabus Mendes à Folha.

A produção estava atrasada em 20 capítulos e vários papeis de destaque na novela acabaram ficando na mão de jovens atores, na época, em virtude da produção aquecida da própria Globo, Manchete e SBT. “Foi por causa da escassez de atores que alguns personagens-chave ficaram na mão de iniciantes, como Adriana Esteves (Patrícia), Lisandra Souto (Jessica) e Fábio Assunção (Marco Antônio”, disse a matéria da Folha. Isso sem contar a estreante Silvia Pfeifer, logo como uma das protagonistas, que foi muito criticada.

Público gosta de sofrer

Os diretores de Meu Bem, Meu Mal foram os mesmos de Tieta, sucesso anterior a Rainha da Sucata – Paulo Ubiratan, Reynaldo Boury e Ricardo Waddington. Na mesma matéria da Folha, Boury falou sobre as mudanças pretendidas e abortadas.

“Havia um sentimento de que as coisas deveriam mudar. Mudaram tanto que tivemos que voltar ao passado. O fato de Rainha da Sucata ser mais moderna [que Tieta] não agradou. Ela virou um novelão no final. Acho que o povo gosta de sofrer um pouco”, destacou.

Meu Bem, Meu Mal não foi um grande sucesso, mas manteve a audiência do horário. Em seguida, veio O Dono do Mundo, outra tentativa de inovação em certos pontos da trama, também rejeitada pelo público. Coincidentemente, trama de Gilberto Braga, que passou novo sufoco em 2015, desta vez com Babilônia.

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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor