Um dos pioneiros da televisão brasileira, Lauro César Muniz foi responsável por criar grandes obras recordistas de audiência da história da Globo. Produções como Escalada (1975), Roda de Fogo (1986) e O Salvador da Pátria (1989) fazem parte de seu currículo na emissora, da qual foi contratado até 2005.

Paloma Duarte
Reprodução / Record

Já no time da Record, o novelista desenvolveu as novelas Cidadão Brasileiro (2006), Poder Paralelo (2009) e Máscaras (2012), trama com Paloma Duarte (foto acima) que marcou sua saída melancólica do gênero. O autor chegou a confessar que aquele trabalho foi um dos momentos mais difíceis de sua extensa carreira na TV.

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Erros em cadeia

Lauro Cesar Muniz

A afirmação foi publicada na coluna de Mônica Bergamo, na Folha de S. Paulo de 29 de julho de 2012. Em entrevista concedida à repórter Anna Virginia Balloussier, o veterano fez críticas ao gênero e foi taxativo ao dizer que nunca mais irá escrever novelas.

Sobre Máscaras, a sua última investida no gênero, Lauro apontou que os seus maiores erros foram os mistérios que se prolongavam demais, principalmente o da protagonista sem nome vivida por Paloma Duarte (Nameless), o grande destaque da produção.

Além disso, o escritor desabafou que sua novela trocou de direção diversas vezes após a estreia, assim como o horário de exibição,  perto da meia-noite, o que atrapalhou o bom andamento da trama. Máscaras concorria, ao mesmo tempo, com a reprise da minissérie Chiquinha Gonzaga (1999), que estava em cartaz na TV a cabo.

“Só ‘A Fazenda’ dá audiência na Record. Aí pergunto: minha novela não estaria sendo vítima disso tudo? Ou foi ela que provocou essa hecatombe? Acho que não”, disse ele, assumindo que este trabalho foi um grande fracasso. “Não vou usar eufemismo, é um fracasso mesmo”, disparou.

Melancolia zero

Manoel Carlos
João Miguel Júnior / Globo

Em outro ponto da conversa, ao ser confrontado com o sucesso de Avenida Brasil, de João Emanuel Carneiro – que na ocasião alcançava 71% dos aparelhos de TV, contra os 66 pontos que O Salvador da Pátria marcava no horário nobre da emissora -, Lauro confessou que não sentia melancolia alguma do passado.

Segundo ele, a grande maioria dos autores dos anos 1970 e 1980 estavam cansados e nenhum deles queria mais fazer novelas. Lauro ainda explicou que os poucos que ainda estavam vivos não estavam trabalhando, enquanto outros, como Benedito Ruy Barbosa e Manoel Carlos (foto acima), haviam realizado alguma coisa.

O que de fato aconteceu, Maneco ainda escreveu Em Família (2014) e Benedito supervisionou os textos de Meu Pedacinho de Chão (2014), Velho Chico (2016) e Pantanal (2022).

Geração arrojada

Sobre João Emanuel Carneiro, Lauro César Muniz ponderou que jovens autores como ele ainda não conseguiram criar uma novidade no gênero. O autor ainda afirmou que, apesar de ter gostado de A Favorita (2008, foto acima), achou a trama da Carminha um amontoado de histórias repetitivas e sem originalidade.

“Avenida Brasil cai numa série de clichês, bastante improváveis, como a patroa virar empregada e empregada virar patroa. Não é uma nova forma, um clichezão. Acho chato”, disparou o autor que discordou que o enredo refletia a nova classe média que se encontrava em ascensão. “A classe C ascendeu através dessa troca? Essa ideia não cola”, completou.

O consagrado escritor argumentou, ainda, que a sua geração era mais arrojada e ousada.

“Nós disputávamos formatos novos. Em 1976, (o dramaturgo) Dias Gomes fez Saramandaia, realismo fantástico: pessoas voavam, gordos explodiam, formiga saía pelo nariz. Fiquei imediatamente desafiado. ‘Pô vou fazer um treco louco também!’ Fiz ‘Casarão’, contada em três épocas. Daniel (Filho, diretor da Globo) arregalava o olho. Era maluca no sentido de desafiar a lei da gravidade”.

Perda de tempo

Lauro César Muniz e Mayara Magri
Reprodução / Instagram

Lauro César Muniz (na foto acima, com Mayara Magri), que hoje está com 85 anos, foi contundente em dizer que os autores da sua época foram os culpados por acostumar o telespectador a querer ver sempre as mesmas coisas e as emissoras se acomodaram.

O escritor também contou à Folha que os diretores de TV não são artistas e que, por estarem ligados ao mundo financeiro, estariam mais preocupados com o orçamento do que com os aspectos artísticos. Ele também manifestou desconfiança com o Ibope, alegando que alguém poderia estar manipulando os índices de audiência.

O autor finalizou revelando que a decisão de pôr um ponto final em sua carreira foi tomada antes da estreia de Máscaras, em abril daquele ano. O que o incomodava era a sensação de estar largando tudo devido ao mau desempenho deste trabalho.

“Sempre disseram: os 30 anos mudam a sua, são uma fossa. Não senti nada. O início da maturidade aos 40? Nada. Com 60, todo mundo fala que é o começo da velhice. Passei leve. O problema começou aos 70. A brincadeira muda. Você olha pra frente: ‘Com muita sorte, tenho mais dez anos de vida útil’. Pesa. Não vou mais fazer novela por isso. Não dá mais, essa perda de tempo”, concluiu.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor