Foram praticamente oito meses no ar. Após uma promissora e movimentada estreia, Boogie Oogie chegava ao fim há exatamente seis anos, no dia 6 de março de 2015, com um saldo para lá de negativo. A trama de Rui Vilhena – autor português (nascido em Moçambique) que estreou seu primeiro folhetim no Brasil -, dirigida por Ricardo Waddington e Gustavo Fernandez, não teve fôlego para se sustentar por tanto tempo e foi se perdendo à medida que os capítulos passavam.

Os primeiros meses empolgaram. Apesar de alguns absurdos – como a vingança fajuta de Suzana (Alessandra Negrini), que só contou que havia trocado os bebês vinte anos depois -, a novela despertou interesse pelo ritmo ágil e bons ganchos. O enredo em torno de Sandra (Isis Valverde) e Vitória (Bianca Bin), que tiveram suas vidas trocadas na maternidade, conduziu muito bem o início do folhetim. Os conflitos funcionavam e movimentavam a história. A grande virada aconteceu quando as duas protagonistas descobriram o crime da amante de Fernando (Marco Ricca), o que resultou em ótimas cenas.

Entretanto, depois desta revelação, o autor passou a explorar dois temas, que dominaram todos os núcleos: o segredo de Carlota (Giulia Gam) e a identidade do pai de Vitória. Inicialmente, o mistério envolvendo o passado da vilã e o drama da patricinha atraíram a atenção. Mas não por muito tempo. A novela começou a andar em círculos, ficando repetitiva e desgastada.

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Problemas no roteiro

Os problemas no roteiro ficaram evidentes, principalmente quando ficou claro que não havia mais subterfúgios para provocar algum tipo de movimentação na trama. Tudo passou a girar em torno de um mesmo assunto.

O famigerado segredo virou o protagonista de Boogie Oogie e os personagens passaram a viver em função deste enigma. O fato apenas reforçou a falta de conflitos individuais nos núcleos, incluindo até mesmo o casal protagonista – já que Sandra e Rafael (Marco Pigossi) ficaram sem função a partir da metade da história, sendo colocados também para investigar o mistério de Carlota. Se o autor tivesse construído boas tramas paralelas, daria tranquilamente para fazer um rodízio de conflitos, destacando cada núcleo e deixando somente para o grande final a abordagem do segredo, evitando assim o desgaste em cima da grande vilã.

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Mas, além de toda esta cansativa situação, o conflito em torno do verdadeiro pai de Vitória (outro tema explorado à exaustão) se transformou em algo teoricamente inútil. Depois de meses de enrolação, foi, praticamente, comprovado que Paulo (Caco Ciocler) era o verdadeiro progenitor da patricinha e não Elísio (Daniel Dantas). No entanto, no último mês foi revelado que o marido de Diana (Maria João Bastos) era estéril. Ou seja, os dramas provenientes do resultado do exame, que demorou meses para ser feito, foram nulos.

Outro problema da história foi o não desenvolvimento de várias relações. Vicente (Francisco Cuoco) e Madalena (Betty Faria) tinham tudo para repetir o sucesso do casal de Pecado Capital, mas o autor escreveu pouquíssimas cenas dos dois juntos. Eles mal contracenaram e ainda terminaram separados. Já a relação de cumplicidade entre Beto (Rodrigo Simas) e Vitória era um dos pontos altos do folhetim, mas a parceria foi aniquilada quando o rapaz se transformou em um capacho da Carlota. A dupla que a patricinha fazia com Dani (Alice Wegmann) funcionava da mesma forma, só que também durou pouco.

E o amor súbito que surgiu entre Inês (ótima Deborah Secco) e Tadeu (Fabrício Boliveira), depois do relacionamento insosso da aeromoça com Beto não ter funcionado, pareceu uma saída de última hora para a personagem, que nunca teve uma função na trama, a não ser ajudar nos planos de Suzana. Mais uma questão que precisa ser citada foi a falta de história do mocinho. Rafael não teve uma vida própria, uma vez que seus dramas se resumiam em ir atrás de Sandra — tanto para ajudá-la quanto para impedi-la de tomar alguma atitude.

Vale citar ainda a falta de destaque de ótimas atrizes, como Ana Rosa, Zezé Motta e Christiana Guinle (retirada da história sem necessidade), que não foram valorizadas como mereciam, e a figuração da boate ‘Boogie Oogie’, que era para ser um dos focos principais da história.

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Pontos positivos

Mas, a novela também teve pontos positivos. Marco Ricca se destacou na pele do canalha Fernando, enquanto Sandra e Rafael formaram um casal protagonista com boa química. Fabíula Nascimento brilhou vivendo sua primeira vilã, a venenosa Cristina, e fez boas cenas. Bianca Bin esteve em seu melhor momento na carreira. Daniel Dantas convenceu interpretando o rígido Elísio e foi bom vê-lo com um tipo que não era bonzinho demais. Foi muito prazeroso assistir Heloísa Périssé dando vida a um tipo totalmente dramático e passivo, bem diferente dos perfis cômicos que a consagraram. Giovanna Rispoli comprovou seu talento com a irônica Cláudia e Osvaldo Mil conseguiu crescer na trama através do seu malandro Homero. Rodrigo Simas se saiu bem com o seu Beto. Giulia Gam também merece elogios, embora Carlota tenha se transformado em uma vilã exagerada demais.

E a maior qualidade do folhetim foi sua trilha sonora: o saudosismo se fez presente com tantas músicas de sucesso dos anos 70 – é de se lamentar, apenas, que a década não tenha sido explorada em função do enredo: Ditadura, Emancipação Feminina, Anistia e outros acontecimentos foram ignorados.

Em sua última semana, como não poderia deixar de ser, a novela seguiu voltada para o segredo de Carlota e a revelação do atropelador que eliminava quem estava próximo da descoberta do tal enigma. Mas também houve o esperado julgamento de Suzana, acusada da troca de bebês, entre outros crimes. A picareta foi condenada em regime aberto e terminou ao lado de Fernando, homem que teve a vida arruinada por ela.

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Já o misterioso passado da vilã foi cheio de furos, além de óbvio: Carlota ficou com as joias verdadeiras que o falecido marido tinha roubado de Carmem Miranda e deixou joias falsas no lugar. O ‘tesouro’ estava escondido no túmulo de Ivan e foi tirado de lá com a maior facilidade (bastou quebrar a tampa da cova e puxar o saco). O pior que é Agata (o Corvo), a grande diaba da história, ficou com bijuterias por anos e nunca percebeu. Aliás, a ‘Corva’ era a atropeladora (o que já estava bem evidente), mas ninguém soube. E o que aconteceu com ela? O público também ficou sem resposta.

Pedro (José Loreto inexpressivo) foi um vilão extremamente cansativo e ficou vidrado em Sandra o tempo todo. Ele a sequestrou no último capítulo, porém, não conseguiu fugir. O acerto do desfecho foi a cena em que Vitória salva Sandra, deixando a rivalidade de lado e mostrando que no fundo sempre foi uma pessoa boa. A patricinha, aliás, terminou flertando com Beto, situação que o autor poderia ter desenvolvido bem antes, ao invés de deixá-la atrás do Rafael feito sombra. Na sequência final teve o elenco dançando na boate, que deveria ter sido o principal cenário do folhetim e não foi.

Boogie Oogie tinha tudo para ter sido uma ótima novela; entretanto, a falta de consistência da trama, o equívoco no desenvolvimento dos núcleos e a enrolação em torno de um segredo (que na verdade era uma grande obviedade) prejudicaram a obra de Rui Vilhena, que – além de desprezada pela crítica – amargou a pior média geral do horário das seis na ocasião. O início da trama ambientada na década de 70 foi promissor, mas o enredo, lamentavelmente, não se sustentou.

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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor