Uma outra novela. Pode-se dizer que O Outro Lado do Paraíso se transformou bastante desde os últimos capítulos da primeira fase e sua transição para a etapa atual. A história das 21h de Walcyr Carrasco, cujos primeiros capítulos pecavam pelas abordagens confusas, pela falta de sutileza característica do texto do autor (em alguns núcleos beirando a caricatura) e pelo ritmo arrastado, ganhou força desde o começo da semana passada, que se refletiu também na definitiva passagem de tempo.

O martírio de Clara (Bianca Bin), que já sofria com as constantes agressões do marido Gael (Sérgio Guizé), tornou-se ainda pior quando a sogra Sophia (Marieta Severo) moveu forças para internar a garota em uma clínica psiquiátrica, localizada em uma ilha distante, e ainda expulsou o avô dela, Josafá (Lima Duarte) do bar em que vivia para explorar a mina de esmeraldas que existia abaixo daquelas terras.

Por lá, ela conheceu Beatriz (Nathalia Timberg), uma misteriosa senhora que havia sido internada pela própria neta (Fabiana, personagem de Fernanda Rodrigues). Herdando a fortuna da nova amiga, a mocinha jurou se vingar de todos os que a humilharam, numa situação que lembra a trajetória de Ana Francisca (Mariana Ximenes), protagonista de Chocolate Com Pimenta (2003-04), do mesmo autor. Em meio a isso, Lívia (Grazi Massafera) se apoderou do filho de Clara, Tomás (vivido por Vitor Figueiredo) e se casou com Renato (Rafael Cardoso).

Na terça-feira da semana passada, em meio a boatos de cortes e alterações, a história começou a apresentar um ritmo bem diferente do que trazia até então: muito mais ágil e dinâmica, com destaque para as grandes cenas da internação de Clara no hospício e da explosão do bar de Josafá.

As cenas destacaram o talento de Bianca Bin, Marieta Severo e Lima Duarte, que vêm brilhando desde os primeiros capítulos, além de deixarem claro que a primeira fase não precisava ser tão extensa – o que deixava a impressão de que a novela era muito “pesada” em função das constantes reiterações e da mão forte do autor na condução dos temas.

E, na última segunda, a esperada passagem de tempo finalmente se concretizou, mostrando também o que havia acontecido com outros personagens – como Raquel (Érika Januza), ex-empregada de Nádia, que entrou para a faculdade de Direito, prestou concurso público e foi nomeada a nova juíza de Palmas; Bruno (Caio Paduan), agora casado com a médica Tônia (Patrícia Elizardo), que forjou uma gravidez; e o romance proibido entre Sophia e o garimpeiro Mariano (Juliano Cazarré). As boas sequências da transição de fase foram enriquecidas pelas canções That Smell (Lynyrd Skynyrd) e Hold On (Alabama Shakes).

Na terça, mais grandes cenas: após Renato descobrir a internação de Clara, logo se dirigiu à clínica e reencontrou a mulher por quem se apaixonou no começo da primeira fase, prometendo ajudá-la a fugir daquele hospício. No entanto, a protagonista foi arremessada de um penhasco em direção ao mar, quase se afogando e lutando para sobreviver. Uma arrepiante cena na qual Bianca Bin mostrou mais uma vez sua competência, além da boa construção de trama feita por Walcyr e da direção impactante da equipe de Mauro Mendonça Filho.

Paralelamente, a história de Estela (Juliana Caldas), a filha anã de Sophia, ganhou novos contornos, contradizendo os rumores de que perderia espaço. Humilhada e expulsa de casa pela mãe, foi morar no interior do Tocantins, ao lado da empregada Rosalinda (Vera Mancini).

As duas atrizes protagonizaram cenas emocionantes e Juliana tem se mostrado uma boa revelação, além do prazer de rever Vera Mancini, que trabalhou antes com Walcyr nas irregulares Morde e Assopra (2011) e Amor à Vida (2013-14).

Outros nomes que também merecem elogios são Nathalia Timberg (que fez uma participação curta, mas emocionou muito como Beatriz), Mayana Neiva (segura e exuberante na pele da prostituta Leandra), Erika Januza (que tem apresentado uma sensível melhora), Caio Paduan (ótimo como Bruno) e Fernanda Montenegro (um dos maiores destaques da novela até aqui).

Por outro lado, Juliano Cazarré e Eriberto Leão não convencem como o garimpeiro amante de Sophia e o médico homossexual enrustido, respectivamente. Rafael Cardoso, intérprete de Renato, repete trejeitos de papeis anteriores, como se estivesse atuando de forma automática. Ellen Rocche, por sua vez, se sai bem como a sensual enfermeira Suzy, mas o contexto a personagem em que está inserida beira ao constrangedor, pois resvala na caricatura fácil.

Deve-se ainda pontuar que o núcleo de Elizabeth/Duda (Glória Pires), de grande destaque na primeira etapa, agora aparenta estar deslocado do resto da história, haja vista a falta de destaque durante a transição. Espera-se que agora, com o encontro de Clara e Duda, as histórias se integrem mais.

Ainda assim, a melhora na dinâmica teve resultados significativos no ibope. A novela saltou de índices em torno dos 30 pontos, na semana passada, para 36 (segunda) e 39 (terça-feira). Algo impressionante, uma vez que a novela vinha em tendência de queda (algo até natural em função do horário de verão, que também contribui para que os números diminuam). A mudança de ares, afastando o aspecto “sombrio” do enredo, aparentemente, agradou o público.

E há muitas facetas a serem exploradas: a concretização da vingança de Clara (um clichê tradicional da teledramaturgia); a virada de Raquel como juíza, surpreendendo Nádia (Eliane Giardini), a patroa que a humilhou; a linda relação de Mercedes e Josafá – o melhor casal da novela; e o aguardado retorno de Caetana (Laura Cardoso), que irá ficar até o fim da história.

Embora muito se critique o autor Walcyr Carrasco por seu estilo pouco ou nada sutil, em detrimento de uma abordagem mais naturalista, é evidente a habilidade do autor em amarrar bem os entrechos de suas tramas e corrigir rumos que não evoluem como o esperado.

Na difícil missão de substituir a aclamada A Força do Querer, fenômeno do ano, Walcyr, elenco e equipe de O Outro Lado do Paraíso ainda têm um longo caminho pela frente. Porém, se o bom nível apresentado nos últimos capítulos continuar, o autor fatalmente terá mais um sucesso para seu vasto currículo.


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