Em Vale Tudo (1988), clássico da TV brasileira, uma das armações de Maria de Fátima (Gloria Pires) para prejudicar a rival Solange (Lídia Brondi) quase acabou em tragédia da vida real.

Vale Tudo

Na novela de Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, Fátima era uma jovem ambiciosa que não media esforços para ficar rica. Ela vende a casa que dividia com a mãe Raquel (Regina Duarte) em Foz do Iguaçu (PR), seguindo para o Rio de Janeiro. Lá, conquista a amizade da jornalista Solange Duprat, que a abriga em seu apartamento.

Sempre apoiada pelo mau-caráter César (Carlos Alberto Riccelli), Maria de Fátima seduz Afonso Roitman (Cássio Gabus Mendes), namorado de Solange, interessada em botar a mão na grana da família dele. Solange não consegue impedir a união do ex e da falsa amiga. O casamento frustra as expectativas de Afonso – e as de Fátima, totalmente dependente da sogra Odete (Beatriz Segall).

Gloria Pires

Uma noite, após discutir com a esposa, Afonso bebe demais, sofre uma tentativa de assalto e é resgatado por Solange. Os dois se amam e, dias depois, ela descobre estar grávida. A editora de moda da revista Tomorrow decide manter a gestação em segredo. Só que Maria de Fátima toma consciência do ocorrido e, temendo perder sua fonte de renda, resolve eliminar mãe e filho.

Erro da polícia irritou diretor

Ricardo Waddington

O plano de Fátima incluía a sabotagem do carro de Solange. César foi quem se encarregou de cortar os freios. A sequência, exibida no capítulo 153, de 8 de novembro de 1988, contou com uma série de percalços nas gravações.

A primeira filmagem foi realizada no estacionamento do Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro, em 22 de outubro de 1988. A produção de Vale Tudo contou com a ajuda de dez bombeiros, duas ambulâncias equipadas como UTI e um caminhão pipa da mesma corporação, além de duas viaturas do 2° Batalhão da Policia Militar e um batedor do destacamento feminino.

O dublê Waldemar Walnes foi recrutado para ocupar o lugar de Lídia Brondi durante a gravação. Com 10 anos de experiência, ele assegurou à revista Amiga, de 11 de novembro de 1988, estar mais do que preparado para a tarefa:

“Estou treinado. Tenho 90% de chances de concluir esta cena sem qualquer problema. Os outros dez ficam por conta do acaso. Afinal, estou vivendo um acidente, de fato”.

Jorge Só, que preparou o carro para a cena, também demonstrou confiança antes das filmagens: “O segredo não conto. Mas posso lhe adiantar que retirei o combustível do carro para que não houvesse risco de incêndio”.

Tudo ok, exceto a autorização para interditar a pista Zona Sul / Centro. O documento chegou com uma hora de atraso e um erro que irritou o diretor Ricardo Waddington (foto acima). O destacamento feminino da polícia apresentou a autorização no sentido contrário, Centro / Zona Sul. “Pra mim chega”, queixou-se Waddington, que, com o cair da noite, reagendou os trabalhos para a semana seguinte.

Acidente quase fatal

Vale Tudo

No sábado, 29 de outubro – aniversário da atriz Lídia Brondi –, a equipe retomou os trabalhos da cena em que Solange e o bebê ficavam entre a vida e a morte. Por um triz, uma tragédia não se abateu sobe o set.

O dublê Waldemar Walnes, que simulava a capotagem no Fiat 147 utilizado para a sequência, pisou com força no acelerador e ultrapassou a rampa preparada pela produção, fazendo o carro cair de lado. O cinegrafista Custódio dos Santos Ferreira não foi atingido por pouco! Custódio, com 26 anos de profissão e 16 de Globo, correu ao ver o carro deslizando em sua direção, assim como três fotógrafos que o cercavam.

O veículo desgovernado destruiu a câmera de Custódio e quase se chocou com o caminhão de externas da emissora. O cinegrafista falou sobre o ocorrido em matéria da revista Contigo!.

“Os fotógrafos tinham combinado ficar do lado da minha câmera para pegar o acidente de frente. Quando vi que o carro não realizou o movimento previsto, ainda tentei salvar a câmera, mas foi tudo tão rápido que não deu tempo”, relatou.

O pânico se instaurou no set, mas Waldemar saiu intacto do acidente graças à roupa especial que protegia seus quadris, ombros e demais articulações, além de uma peruca igual aos cabelos da personagem Solange, por cima de um reforçado capacete.

“Fiz tudo como estava previsto. A cena foi perfeita. Se fui em direção à câmera não sei. Não sou eu quem determina o local em que ela deve ficar. Minha missão era realizar a capotagem”, explicou. “Dizer que a gente nunca se machuca é mentira”, completou.

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Sebastião Uellington Pereira é apaixonado por novelas, trilhas sonoras e livros. Criador do Mofista, pesquisa sobre assuntos ligados à TV, musicas e comportamento do passado, numa busca incessante de deixar viva a memória cultural do nosso país. Escreve para o TV História desde 2020 Leia todos os textos do autor