A Força do Querer e Pega Pega: ibope alto, repercussões diferentes
18/10/2017 às 10h00
Em se tratando de audiência, o horário nobre da Globo vive o seu melhor momento em anos. Todas as faixas – principalmente as novelas e o Jornal Nacional – vêm marcando índices que não se viam há cinco ou seis anos. Alguns fatores levam a isto, como a saída das concorrentes Record, RedeTV e SBT (Simba Content) das TVs a cabo – para as quais voltaram no mês passado.
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Neste contexto, chamam atenção dois diferentes casos envolvendo as atuais novelas das 19h e 21h, respectivamente, Pega Pega e A Força do Querer. As duas histórias têm atualmente as melhores audiências de seus horários desde os fenômenos Cheias de Charme e Avenida Brasil, os dois grandes arrasa-quarteirão de 2012. No entanto, há uma diferença evidente: enquanto a novela de Glória Perez mobiliza os comentários, discussões e conversas populares em torno dos seus dramas e personagens, a história da novata Cláudia Souto não chega nem perto disso.
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Na história das nove, a poucos capítulos do seu desfecho, Glória se reinventou e superou as desconfianças iniciais existentes, abandonando a fórmula de suas últimas três novelas e investindo em entrechos e personagens impactantes, além de fortes campanhas sociais (uma marca da autora). Tudo isso sem abrir mão do tradicional estilo novelístico.
Não é difícil encontrar quem se identifique com as dúvidas de Ivana/Ivan (Carol Duarte), ou quem se emocione com o drama de Joyce (Maria Fernanda Cândido), ou quem torça pelo final feliz de Jeiza (Paolla Oliveira) e Zeca (Marco Pigossi), ou para que Bibi (Juliana Paes) seja punida por sua conduta criminosa ao lado de Rubinho (Emílio Dantas) – ou então que se regenere e retome sua relação com Caio (Rodrigo Lombardi).
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Aliás, o enredo de Bibi despertou críticas de setores conservadores, que acusam a autora de fazer apologia ao crime. Tal alegação não se sustenta, justamente pela presença de Aurora (Elizângela), mãe de Bibi, temerosa pela vida criminosa da filha; e de Jeiza, policial competente e segura de si. E no fim da semana passada, a autora prestou uma homenagem merecida aos policiais mortos no Rio de Janeiro este ano, através da morte de um colega da major, Gerson (Well Aguiar), usando trechos de um discurso do Secretário de Segurança do Rio. Foi difícil não se emocionar.
Tudo isto é fruto de um enredo consistente – apesar de alguns elementos conduzidos de forma errada, como a trama de Silvana (Lilia Cabral), que anda em círculos; e da expectativa de que os desfechos sejam resolvidos apenas no último capítulo, deixando o final corrido – e de um trabalho de elenco forte e coeso, eliminando o excesso de atores e proporcionando um melhor aproveitamento do grupo – embora alguns ainda tenham ficado avulsos.
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Não são poucos os nomes que se destacam: Juliana Paes tem nas mãos o papel mais impactante de sua carreira; Paolla Oliveira ganhou sua protagonista mais completa e cativante; Isis Valverde emociona em todos os momentos; Dan Stulbach e Maria Fernanda Cândido voltam à TV; Humberto Martins e Marco Pigossi trabalharam muito bem a versatilidade – diferenciando tipos que poderiam ser iguais a papeis recorrentes em suas carreiras; Carol Duarte, Silvero Pereira e João Bravo se mostram grandes revelações e Elizângela emociona como a mãe desesperada pela vida equivocada da filha. Todo este conjunto de acertos contribui decisivamente para a imensa repercussão da novela.
Pega Pega não tem nada disso. Estreia da roteirista Cláudia Souto, pupila de Walcyr Carrasco, a novela das sete tinha como proposta falar, usando a leveza do horário das 19h, sobre a ética, através de quatro criminosos de primeira viagem: funcionários de um hotel de luxo que pretendiam roubar 40 milhões de dólares que seriam pagos pelo empresário Eric (Mateus Solano). Um deles, o garçom Júlio (Thiago Martins), arrepende-se do roubo à medida em que se envolve com Antônia (Vanessa Giácomo), inspetora que conduz a investigação.
Apesar do tema, a novela não consegue prender a atenção. O enredo dá a sensação de um completo vazio, com perfis e entrechos rasos. O casal principal, Eric e Luiza (Camila Queiroz), não tem qualquer química e não desperta simpatia do público, além de sua construção inicial rápida demais.
Os enredos paralelos são ainda mais cansativos e não agregam. Nem mesmo a atual fase da investigação do roubo, que já identificou três membros do grupo – falta apenas o mentor, o ex-concierge Malagueta (Marcelo Serrado) – consegue atrair qualquer atenção.
O resultado disso tudo é um grande número de talentos desperdiçados: Irene Ravache, Mateus Solano, Camila Queiroz, Elizabeth Savalla, Marcos Caruso, Reginaldo Faria, João Baldasserini, Vanessa Giácomo, Guilherme Weber, Ícaro Silva, Virgínia Rosa, Marcelo Serrado, Mariana Santos, Milton Gonçalves, Dani Barros, Valentina Herszage, Danton Mello, Nicette Bruno, Cristina Pereira… Não são poucos. A única que consegue algum espaço é Nanda Costa, que diverte com sua maluquinha Sandra Helena – por outro lado, Thiago Martins e Rômulo Neto são os destaques negativos.
Com um conjunto tão insosso, seria natural que Pega Pega fracassasse também na audiência. Porém, por mais incrível que pareça, a novela tem excelentes índices, os melhores desde Cheias de Charme – superando inclusive as elogiadas Totalmente Demais e Rock Story. Como explicar isso?
O atual momento de audiência da emissora carioca é responsável por grande parte disto. A Força do Querer estreou em Abril, sucedendo a malfadada A Lei do Amor, e logo foi ganhando força e impulsionando a grade. Nos horários anteriores também houve subida: Senhora do Destino elevou os índices da reprise de Cheias – bem como Malhação Viva a Diferença (em relação a Pro Dia Nascer Feliz) e Novo Mundo, às 18h (em relação a Sol Nascente).
Rock Story, por sua vez, recuperou parte da audiência perdida durante o horário de verão. Some-se a isso também o Jornal Nacional, aquecido pela intensa crise política em Brasília, frequentemente com edições mais longas que o normal. Como Pega Pega estreou em junho, acabou se beneficiando pelo bom momento de audiência, funcionando como sala de espera.
A saída das emissoras da Simba das TVs a cabo (especialmente a Record) também é responsável por isto. Sem concorrência forte – uma vez que Belaventura foi prejudicada pela desnecessária reprise de Os Dez Mandamentos -, a novela das sete sai ganhando.
Além do mais, a própria história segue um estilo mais despretensioso e leve, calcado na comédia e romance fáceis – em contraponto ao roteiro ousado de Rock Story, que trazia personagens nada maniqueístas e abordava os bastidores do mercado musical. Sendo assim, é encarada como um simples passatempo, sem muito compromisso.
Estes fatores podem ser considerados os principais determinantes para que Pega Pega tenha a melhor audiência do horário em anos, mesmo não tendo nem de longe a mesma repercussão do excelente enredo de A Força do Querer. A novela das sete se beneficia deste conjunto da grade atual e da sua aura leve. Ainda assim, seus pontos negativos são bem maiores que os positivos. Diante disso, provavelmente não deixará saudades quando acabar, em janeiro do ano que vem.