Silvio de Abreu é um dos principais autores de novelas do País e emplacou grandes sucessos como Guerra dos Sexos (1983), Rainha da Sucata (1990) e A Próxima Vítima (1995). Em 2015, assumiu o posto de diretor de teledramaturgia diária da Rede Globo – ?cargo criado após a saída do diretor de entretenimento Manoel Martins, junto com outras divisões comandadas por Guel Arraes, Boninho e Ricardo Waddington?, passando a responder pelas novelas e mini/microsséries diárias. Passados dois anos, a gestão do autor tem sido marcada por decisões controversas.

A primeira polêmica se deu em setembro de 2015, quando foi adiada a estreia da atual novela das nove, A Lei do Amor, que seria a sucessora de A Regra do Jogo. Em seu lugar, entrou Velho Chico, projeto de Benedito Ruy Barbosa com sua filha Edmara e seu neto Bruno Luperi, outrora prevista para as 18h.

A principal alegação era de que a história de Adelaide tinha uma trama política muito forte, que seria comprometida se coincidisse com as eleições municipais de 2016. Outro motivo para a decisão teria sido a mudança de estilos, deixando de lado as tramas urbanas e realistas ambientadas em centros como Rio de Janeiro e São Paulo, para abrir espaço para uma linha mais bucólica e regionalista, valorizando o Nordeste brasileiro e as regiões banhadas pelo Rio São Francisco.

Ao longo do tempo, a motivação para o adiamento da história de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari mostrou-se infundada, uma vez que Velho Chico, em sua segunda fase, teve fortes tintas políticas, envolvendo personagens como Carlos Eduardo (Marcelo Serrado), Santo (Domingos Montagner), Beatriz (Dira Paes), Raimundo, prefeito da cidade fictícia de Grotas de São Francisco (Saulo Laranjeira) e Tereza (Camila Pitanga).

Na atual novela, o contexto político envolvendo a sucessão municipal em São Dimas nunca foi desenvolvido de forma convincente e virou uma grande galhofa – muito em função de embates envolvendo Luciane (Grazi Massafera), Mileide (Heloísa Perissé), Salete (Cláudia Raia) e Hércules (Danilo Grangheia).

Mais recentemente, a atuação de Silvio tem chamado a atenção pelo cancelamento ou alteração de sinopses de autores.

A primeira delas foi O Homem Errado, ideia original de Duca Rachid e Thelma Guedes, que fariam sua estreia às 21h após A Força do Querer, de Glória Perez.

A trama teve a sinopse aprovada e estava com 12 capítulos prontos e bem avaliados, porém foi cancelada sem maiores explicações. No lugar da dupla, assume seu lugar Walcyr Carrasco (de quem ambas são pupilas), que fará sua segunda trama no horário.

Pouco depois, Lícia Manzo teve o projeto de sua história das 23h (intitulada Jogo da Memória) alterado: virou uma minissérie e foi adiado para 2018.

A vaga foi preenchida pela trama Os Dias Eram Assim, das novatas Ângela Chaves e Alessandra Poggi, que falará sobre a ditadura brasileira. Outros autores com sinopses canceladas foram Rui Vilhena (autor de Boogie Oogie), Maurício Gyboski (que estrearia com uma sinopse sobre o mundo sertanejo), Antônio Calmon e Cláudia Lage.

Por um lado, há a possibilidade de estas obras apresentarem possíveis problemas em função de elementos que poderiam afugentar o público. Como exemplo, há o caso de Liberdade, Liberdade, novela das 23h exibida em 2016, cuja autora original Márcia Prates foi substituída pelo roteirista Mário Teixeira, em função de inconsistências no texto da primeira. Este problema, em especial, atinge os autores mais jovens, ?ficando a sensação de desprestígio, dificultando que novos valores possam se consolidar, ainda mais se considerar que enquanto algumas destas obras sofrem alterações ou são arquivadas, tramas pífias como Sol Nascente, do veterano Walther Negrão, ganham espaço.

Também são constantes as alterações de ordem. Anos Incríveis, sinopse das 19h de Izabel de Oliveira e Paula Amaral, foi antecipada após o cancelamento da sinopse de Calmon, mas foi novamente adiada para a entrada de uma história de Daniel Adjafre. Amor e Morte, de Alcides Nogueira e Bia Correia do Lago, também foi antecipada e jogou para a frente a nova trama de Elizabeth Jhin.

Outra atuação polêmica de Abreu diz respeito às interferências na história de novelas, como é o caso de Babilônia e da já citada A Lei do Amor.

A primeira, cuja estrutura central já era fraca, teve seus núcleos de humor aumentados e núcleos promissores foram destruídos (como foi o caso de Alice, personagem de Sophie Charlotte, que se prostituiria e acabou virando uma simples mocinha).

A segunda, com uma espinha dorsal superior, também vem sofrendo com a descaracterização de seus núcleos, com o sumiço de personagens importantes, como Beth (Regiane Alves), Aline (Arianne Botelho) e o senador Venturini (Otávio Augusto) e a mudança repentina na personalidade de alguns outros, como Jéssica (Marcella Rica), Pedro (Reynaldo Gianecchini) e Letícia (Isabella Santoni), além da péssima condução do triângulo envolvendo Letícia, Tiago (Humberto Carrão) e Isabela/Marina (Alice Wegmann).

Boa parte dessas mudanças é reflexo dos resultados dos grupos de discussão promovidos pela emissora e estas alterações não estão surtindo efeito. Mas deve-se enfatizar: Silvio não é o único responsável, uma vez que Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari obedeceram a essas mudanças, prejudicando a condução do enredo.

Posteriormente, a entrada de Ricardo Linhares, coautor de Babilônia, piorou a situação, uma vez que o autor não soube como conduzir sua própria novela.

Ironicamente, em Torre de Babel (1998), em cartaz no Viva, quando ainda não existia este cargo, Silvio também fez mudanças em sua história, como a eliminação de personagens como Guilherme (Marcelo Antony), Rafaela (Christiane Torloni) e Leila (Sílvia Pfeifer); a transformação de Clementino (Tony Ramos), antes um tipo dúbio, em mocinho; e a intensificação da vilania de Ângela (Cláudia Raia), apaixonada por Henrique (Edson Celulari). Porém, desta vez, o resultado foi positivo e a novela continuou impactante.

A julgar pelos resultados apresentados, a gestão de Silvio de Abreu como diretor de teledramaturgia vem trazendo mais erros do que acertos.

É justo reconhecer que os outros horários (18h, 19h e 23h) estão cada vez mais sólidos, com novelas de sucesso. E não se está aqui questionando, de nenhuma forma, a competência do veterano autor, uma vez que há a intenção de acertar com essas mudanças, em algumas vezes até dando certo.

Mas apenas deve-se registrar que a interferência de Abreu no planejamento da dramaturgia diária da emissora carioca vem se caracterizando, mais recentemente e principalmente, por decisões erradas – ?em especial na agora frágil faixa das 21h, outrora a mais forte da Globo.


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