Os Dias Eram Assim tem estreia despretensiosa e promissora

18/04/2017 às 13h00

Por: Sergio Santos
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“O que a história separou só o amor pode unir de novo”. A nova novela das onze, agora chamada de “supersérie”, representa bem a frase dita no teaser da produção: um amor entre dois jovens sendo atingido o tempo todo por um doloroso contexto histórico. Os Dias Eram Assim estreou nesta segunda-feira (17) com um capítulo despretensioso e que retratou muito bem (em apenas 40 minutos) tudo o que o enredo irá abordar ao longo dos próximos meses. Um romance clássico norteia o roteiro, cujo foco é a Ditadura Militar e todos os processos enfrentados pelo Brasil nas décadas de 70, 80 e 90. Ficção e a realidade que muitos viveram sendo mesclados.

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Prevista inicialmente para ser um folhetim das seis, a produção foi transferida para o horário das onze e acabou beneficiada, pois a faixa permite uma exploração bem maior em torno das torturas, crimes e momentos mais fortes envolvendo o regime militar.

Angela Chaves e Alessandra Poggi estreiam a primeira novela delas como autoras principais, após anos trabalhando como colaboradoras. A Globo vem investindo cada vez mais em escritores novos e a atitude é mais do que válida. A exibição do primeiro capítulo (disponível uma semana antes pelo aplicativo Globo Play) mostrou um enredo bem estruturado e dramas bastante convidativos.

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A trama começou exibindo imagens reais de manifestações a favor da constituição, dos militares revistando pessoas nas ruas e capas de jornal a respeito do “AI-5” (o Ato Institucional mais duro do governo militar), do anúncio dos Gorilas de um golpe contra Jango, entre outras matérias. E toda essa compilação era embalada pela marcante música “Deus lhe Pague”, cantada pela saudosa Elis Regina.

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Após esse breve clipe, a história de fato começou e em clima de final de Copa do Mundo, no Rio de Janeiro de 1970 (quando o Brasil venceu a Itália por 4 a 1). Em meio a protestos e ao povo comemorando, o público foi sendo apresentado aos personagens principais de forma tranquila, sem maiores atropelos. E já deu para perceber com clareza o mote do enredo.

Foi uma estreia promissora, presenteando o telespectador com o capricho dos cenários e carros da época (até o clássico Fusca da polícia foi reproduzido com perfeição), além de bons conflitos envolvendo tanto o mocinho quanto a mocinha. Aliás, o acerto na escalação dos talentosos Renato Góes e Sophie Charlotte já é um fato. Os dois estão seguros vivendo o médico Renato e a libertária estudante de Letras Alice, esbanjando química desde a primeira troca de olhares até o primeiro beijo quente em meio a enfrentamentos entre policiais e estudantes. A licença poética para expor o nascimento do intenso amor do casal, por sinal, foi muito bem-vinda, refletindo com criatividade o grande significado dessa novela, que é contar um romance ficcional dentro de um contexto real.

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Logo nesse início, foi possível ver a luta de Alice contra o conservadorismo da família e do noivo, o mauricinho Vitor (Daniel de Oliveira). Ela choca a todos quando aparece na sala de casa com uma roupa decotada e curta, gritando pelo Brasil. O pai, o poderoso Arnaldo (Antônio Calloni), apoia o regime militar (financiando um grupamento especial contra opositores) e se indignou ao ver a filha ‘daquele jeito’ diante dos seus convidados (incluindo vários generais), culpando a esposa, Kiki (Natália do Vale), pela ‘má educação’ da menina.

Alice acaba enfrentando a mãe e ainda tenta transar com Vitor, se despindo diante dele, mas acaba rejeitada porque o noivo considera seu comportamento vulgar. A sequência foi uma das melhores da estreia, delineando bem os perfis, sendo necessário citar ainda a interesseira Cora (Susana Vieira), mãe de Vitor, que estava presente na reunião, e a doce Nanda (Letícia Braga), irmã da mocinha.

Ao mesmo tempo, também foi atrativo ver a apresentação da trama do mocinho, expondo a família do rapaz e a sua rotina como médico. A mãe (Vera – Cássia Kiss) é dedicada aos filhos e a irmã (Maria – Carla Salle) uma jovem engajada. O irmão dele, o estudante Gustavo (Gabriel Leone), já se envolve em uma grave confusão com a polícia por causa do amigo Túlio (Caio Blat), que joga uma bomba caseira na entrada da construtora de Arnaldo e acaba baleado e preso em flagrante, sendo torturado e morto tempo depois.

Como estava ao lado do idealista, o garoto vira alvo e passa a ser perseguido pelo empresário, que, por coincidência, passa a odiar Renato em virtude de uma confusão no hospital – o médico fez o parto de Monique (Letícia Spiller), esposa de Toni (Marcos Palmeira), que é irmão do poderoso, e não aceita a imposição do pai de Alice em transferir a cunhada para um hospital particular.

O elenco é um dos acertos da produção e o excelente desempenho de todos logo no primeiro capítulo comprova isso. Antônio Calloni vivendo um vilão enérgico tem tudo para ser um dos grandes destaques, assim como Cássia Kiss na pele de uma mãe amorosa. Renato Góes e Sophie Charlotte, como já mencionado, esbanjam sintonia e prometem bons momentos juntos. Susana Vieira e Natália do Vale são outras que também se sobressaíram nesse começo e vale elogiar ainda Letícia Spiller, Marcos Palmeira, Daniel de Oliveira e Marco Ricca, vivendo um delegado cúmplice de Arnaldo.

Outro ponto que merece elogio é a primorosa abertura, que exibe imagens de jornais e ainda tem “Aos Nossos Filhos” como tema – bela canção de Ivan Lins e eternizada por Elis Regina. Aliás, a música é cantada lindamente pelos protagonistas Sophie Charlotte, Maria Casadevall, Gabriel Leone, Renato Góes e Daniel de Oliveira. O diretor Carlos Araújo fez a ousada proposta e os atores aceitaram. Valeu a pena.

A trilha da produção é outro êxito e tanto, pois reúne vários clássicos das décadas de 70 e 80, como “A Lua Girou” (Milton Nascimento), “Sociedade Alternativa” (Raul Seixas), “Divino Maravilhoso” (Gal Costa), “Não Sei Dançar” (Marina Lima), “Fala” (Secos & Molhados), “Joana Francesa” (Chico Buarque), “20 e Poucos Anos”( Fábio Jr.), “Amor” (Secos & Molhados), “Ando Meio Desligado” (Mutantes), “Flores Astrais” (Secos & Molhados”), “Linguagem do Alunte” (Novos Baianos), “Sangue Latino” (Ney Matogrosso), entre outros.

Os Dias Eram Assim teve um bom começo e as autoras Alessandra Poggi e Angela Chaves têm uma boa história em mãos. O tema da Ditadura (cuja abordagem mais lembrada até hoje foi a da minissérie Anos Rebeldes) sempre rende bons dramas e os conflitos elaborados por elas aparentam um bom potencial. Resta aguardar e torcer para que a qualidade se mantenha.

SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas


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