Neste domingo (12/11), o Domingo Espetacular colocou como a matéria da semana as declarações de cunho racista de William Waack, provocando seu afastamento na Globo. Foram 11 minutos de reportagem sobre toda a polêmica que ocorreu em torno do jornalista de sua concorrente. Nada de anormal nisso, afinal, foi um assunto de imensa repercussão e toda a imprensa noticiou o caso (provocando atenção até de veículos internacionais). O problema dessa reportagem específica é o telhado de vidro da Record.

A emissora dos bispos exibiu uma longa reportagem, sem apresentar nada de novo, reexibindo o trecho da declaração deprimente do jornalista e expondo as reações negativas de alguns atores da Globo, como Bruno Gagliasso, Cris Vianna e Lázaro Ramos, além de ferrenhas críticas de militantes negros.
O programa ainda entrevistou Diego Pereira, operador de TV que presenciou o comentário de Waack e o divulgou um ano depois, quando foi demitido da emissora. Ainda exibiu declarações de Robson Cordeiro, amigo do rapaz que o ajudou a divulgar o vídeo.

Mas, ironicamente, quem estava apresentando a revista eletrônica dominical da Record e ainda anunciou a matéria foi Paulo Henrique Amorim. Para quem não lembra, o jornalista foi condenado por injúria racial em 2015, quando perdeu definitivamente o processo movido por Heraldo Pereira, comentarista político do Jornal da Globo (e cotado para substituir Waack na bancada).
O jornalista da Globo se sentiu ofendido, com razão, quando Paulo o chamou de ‘negro de alma branca’ em um texto de seu blog. Ou seja, a situação beirou o absurdo ou expôs o retrato do cinismo.

Isso porque a Record nada fez contra o jornalista na época. Ele não foi afastado, punido, advertido e muito menos demitido. Continuou trabalhando como se nada tivesse acontecido. Portanto, a emissora demonstrou não se importar muito com injúrias raciais, desde que sejam feitas por nomes conhecidos. Afinal, é preciso lembrar também que o mesmo canal demitiu Marcão do Povo, após o apresentador do Balanço Geral – DF ter dito que a cantora Ludmilla era uma ‘pobre macaca’. A diferença é que ele era um nome sem qualquer relevância no meio e só conhecido em Brasília, ao contrário de Paulo. A impressão passada é de que só há punição dependendo da importância do nome.

E se a emissora queria tanto exibir uma reportagem explorando as declarações racistas de William Waack, precisava colocar Paulo Henrique Amorim para apresentar? A memória do povo brasileiro realmente é bem curta, mas não é para tanto.

Colocar um jornalista condenado por injúria racial para anunciar uma matéria de um colega acusado do mesmo crime é, no mínimo, uma atitude bastante cínica. Para culminar, a emissora acabou, involuntariamente, expondo seu telhado de vidro, ‘lembrando’ o telespectador que, ao contrário da concorrente, não tomou nenhuma atitude a respeito. Feio.

SÉRGIO SANTOS é apaixonado por televisão e está sempre de olho nos detalhes, como pode ser visto em seu blog. Contatos podem ser feitos pelo Twitter ou pelo Facebook. Ocupa este espaço às terças e quintas


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Sérgio Santos é apaixonado por TV e está sempre de olho nos detalhes. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor