Antes da Globo, dramalhão cubano foi a primeira novela a parar o Brasil
07/12/2021 às 9h50
O Brasil é o país das novelas por culpa de um cubano. Tudo começou, indiretamente, em 1946, quando Félix Caignet escreveu a radionovela O Direito de Nascer, um grande sucesso, exibida em vários países e com diversas reedições ao longo das décadas.
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A primeira versão da história foi transmitida pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro no início dos anos 1950, com grande êxito.
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Mas há exatamente 56 aos, a partir de 7 de dezembro de 1964, quando a TV Tupi passou a exibir O Direito de Nascer diariamente às 21h30, o Brasil parava para assistir aos capítulos.
A história era simples, com elementos típicos de dramalhão mexicano: “Um filho natural (a mãe envergonhada foi ser freira e o pai, canalha, desapareceu), criada por uma mãe negra, cresce, forma-se médico, tem uma namorada, mas não consegue desvendar o mistério de sua origem, porque quem sabe de tudo perdeu a voz e só vai recuperá-la, evidentemente, no último capítulo”.
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Assim definiu reportagem especial da revista Veja de 7 de maio de 1969, que abordou a febre de telenovelas que tomava conta do Brasil, desta vez pelo sucesso de Beto Rockfeller, também da Tupi.
Primeira novela que parou o Brasil
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“As crianças passaram a nascer com o nome de Albertinho Limonta. Nas cidades, o grau de utilização da rede sanitária caiu sensivelmente na hora da novela (21h30 às 22h). Os encontros nacionais, desde sessões de Senado até ofícios religiosos, foram habilmente deslocados para não perturbar a audição do drama da paternidade desconhecida”, destacou a matéria da Veja.
Os integrantes do elenco de O Direito de Nascer tornaram-se celebridades nacionais: Nathália Timberg era Maria Helena, a mãe que virou freira; Amilton Fernandes vivia o abandonado Albertinho Limonta; Isaura Bruno era a Mamãe Dolores, que criou o criou; e Guy Loup era sua namorada, Isabel Cristina. Também participaram nomes como José Parisi, Rolandro Boldrin, Henrique Martins, Luiz Gustavo e Oswaldo Loureiro, entre outros.
A mesma reportagem traçou um panorama da revolução que estava em andamento naquela época na televisão brasileira:
“A partir de O Direito de Nascer, o brasileiro começa a consumir as telenovelas em doses cavalares. As histórias, que antes se resolviam modestamente em um máximo de 50 capítulos e transmissões duas ou três vezes por semana, passam a exibir centenas de sessões diárias. Quatro anos depois, a telenovela é uma epidemia nacional. Na semana passada, todos os dias, 9 milhões de brasileiros receberam de 43 emissoras pelo menos uma das 24 novelas que caem sobre o País juntamente com as trevas da noite. Das 18h30 às 22h, 80% dos 3,5 milhões de aparelhos de TV puxam para dentro das casas desfiles de personagens tão variados e ricos em roupagens e cenários quanto monótonos e esquemáticos em suas relações”.
Repercussão sem precedentes
Para se ter uma ideia do sucesso de O Direito de Nascer, exibida até 13 de agosto de 1965, uma grandiosa festa foi realizada para encerrar a trama. Todo o elenco percorreu as ruas de São Paulo em carro aberto, da sede dos Diários Associados até o Ginásio do Ibirapuera.
No Rio de Janeiro, onde a trama foi exibida pela TV Rio, a festa foi ainda maior, no Maracanãzinho. Como define nosso colunista Nilson Xavier, “uma neurose coletiva, sem precedentes, já que nenhum ator brasileiro, em qualquer época, tivera as honras de tanta ovação”.
Guy Loup, inclusive, passou a assinar Isabel Cristina em seus trabalhos seguintes, tamanha a repercussão da novela.
Tupi do Rio abriu mão da novela
Naquela época, a Tupi ainda não era uma rede nacional propriamente dita. As emissoras de São Paulo e do Rio de Janeiro não precisavam exibir, necessariamente, a mesma programação. Por divergências internas, a Tupi carioca desdenhou da novela e não quis exibi-la, provavelmente se arrependendo da decisão depois.
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Em seu livro O Circo Eletrônico, o diretor Daniel Filho conta como foi a negociação.
“A Tupi do Rio de Janeiro não aceitou O Direito de Nascer no ar. Mas o Boni [José Bonifácio de Oliveira Sobrinho], pessoalmente, junto com o Walter Clark, comprou os direitos da novela. Félix Caignet, o autor cubano, que vivia no México, quis receber o pagamento em dinheiro vivo. Dercy Gonçalves e David Raw foram os portadores dos dólares, que viajaram costurados no casado de pele da Dercy, e trouxeram os textos originais. A TV Record de São Paulo não se interessou, mas Cassiano Gabus Mendes, diretor da Tupi, aceitou produzir a novela para exibição em todo o Brasil, deixando a praça carioca para a TV Rio”.
O Direito de Nascer teve duas novas versões produzidas no Brasil: em 1978, pela própria Tupi, já em seus últimos tempos, com Eva Wilma e Carlos Augusto Strazzer, e em 1997, no SBT, com exibição somente em 2001, com Guilhermina Guinle (foto acima) e Jorge Pontual. Ambas não tiveram, nem de longe, a repercussão da exibição original.