Para qualquer ator ou atriz, viver um personagem de sucesso é a chance de receber um impulso decisivo para a carreira ou então de conquistar a consagração definitiva. Mas, ao mesmo tempo, pode acabar se transformando em uma espécie de “prisão”.

É como se, após a interpretação de um determinado papel aclamado com elogios e prêmios, um artista fosse “proibido” de atuar em outra trama na pele de alguém completamente diferente, o que inclusive é visado justamente para fugir de rótulos incômodos.

Confira na lista alguns dos casos mais emblemáticos:

Beatriz Segall – Odete Roitman (Vale Tudo)

A arquivilã da teledramaturgia brasileira deixou marcas profundas em Beatriz Segall, a tal ponto que a atriz, falecida em 5 de setembro de 2018, aos 92 anos, detestava a ideia de ter a importância de sua longa carreira restrita à megera rica, elegante e inescrupulosa.

Nosso colunista Nilson Xavier também abordou a questão, revelando que Beatriz Segall ficou muito tempo sem falar na personagem após a conclusão da novela, que ficou marcada pela pergunta: “Quem matou Odete Roitman?”.

Além disso, ela nunca mais quis interpretar outra vilã para se afastar desse estigma. Por outro lado, o colunista também lembrou que, ao Memória Globo, a atriz declarou: “Sempre me encabulo quando tenho que falar da Odete Roitman, fico com medo de parecer pretensiosa, e tenho certeza de que não sou, mas acho que ninguém na televisão brasileira recebeu um presente tão grande como esse”.

Marcos Frota – Tonho da Lua (Mulheres de Areia)

Com uma deficiência mental agravada pelo trauma de ter presenciado a morte do pai na infância, Tonho da Lua certamente foi o personagem mais desafiador da carreira de Marcos Frota, que o interpretou no remake de Mulheres de Areia (1993). Integrante do núcleo de pescadores da trama, alimentava uma paixão platônica por Ruth (Glória Pires) e tinha um talento notável para fazer esculturas de areia na praia.

Ao site F5, da Folha de S. Paulo, o ator resumiu em abril de 2021 como encara a repercussão de seu trabalho, já que é chamado nas ruas pelo nome do personagem mesmo depois de quase 30 anos.

“Com muita humildade, sei que o Tonho da Lua rompeu a barreira do tempo. Ao lado de Ruth e Raquel, é um personagem que entrou para a história da TV brasileira. Fiz tudo com muito amor e o público retribuiu com muito carinho. Tonho da Lua é para sempre”, resumiu Frota, que admitiu ter encarado como o maior desafio para interpretá-lo deixar de lado o ego e a vaidade.

Ricardo Macchi – Cigano Igor (Explode Coração)

A pouca expressividade do personagem de Explode Coração (1995) fez com que Ricardo Macchi convivesse por anos a fio com diversas críticas e piadas, tornando-se um sinônimo de galã que não deu certo. Mesmo sendo na ocasião um modelo novato na teledramaturgia, venceu a disputa pelo papel contra os já experientes Eduardo Moscovis e Adriano Garibe.

Ao jornal Extra, em 2015, ele havia criticado a lembrança recorrente de que o personagem teria sido um fracasso. “Sempre a mesma coisa? Não cansam? Não acham que as pessoas merecem uma dedicação maior? O tempo passa. Dirigi, roteirizei, apresentei e produzi…. a vida anda. Uma dica: não parem no tempo. Eu não parei”.

Já ao UOL, em 2019, celebrou a completa superação do estigma deixado pelo cigano Igor, nunca tendo para isso recorrido a drogas e outros vícios.

Cacá Carvalho – Jamanta (Torre de Babel/Belíssima)

“Jamanta não morreu” talvez seja uma das expressões de personagens de novela mais lembradas de todos os tempos pelo público. Em uma entrevista ao GShow, publicada no ano passado, o ator Cacá Carvalho falou sobre a importância da frase.

“Quando você vê o trabalho sendo abraçado, imitado e virando quase um meme, isso é muito bonito. Virou um verdadeiro bordão coletivo. Foi um momento lindo”, elogiou.

Inicialmente, Jamanta (ou Ariovaldo da Silva, funcionário de um ferro-velho que tinha transtornos mentais) morreria na explosão do shopping center que marcaria a trama de Torre de Babel (1998), mas o grande sucesso fez com que ele fosse poupado da tragédia.

Do mesmo autor, Silvio de Abreu, Belíssima (2005) também contou com o personagem no elenco, desta vez trabalhando como mecânico na oficina de Pascoal (Reynaldo Gianecchini).

Mel Lisboa – Anita (Presença de Anita)

A ninfeta que seduz um homem bem mais velho (Nando, interpretado por José Mayer), tão bem representada por Mel Lisboa em Presença de Anita (2001), levou muito tempo para ser uma página virada (ainda que crucial) na carreira da atriz.

Mesmo 20 anos após a minissérie que a levou ao estrelato, a personagem (que, na verdade, se chamava Cíntia) ainda é bastante lembrada, mas ela contou ao podcast Oito Minutos que hoje não se importa com a associação.

Na mesma entrevista, revelou que esteve a ponto de desistir da carreira quando foi chamada pela Globo para dar vida à protagonista.

“Na época, eu achava que entendia tudo. Mas depois percebi que não. Estava no olho do furacão, e minha vida mudou do dia para a noite”, contou ao jornal O Globo em julho deste ano a atriz gaúcha, que admitiu ter negado a própria sensualidade durante algum tempo por ter sido alçada à condição de símbolo sexual com apenas 19 anos.

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Sérgio Hondjakoff – Cabeção (Malhação)

Ao longo de 25 anos, a novela infantojuvenil Malhação formou uma galeria considerável de personagens que marcaram suas respectivas épocas. Sem a menor dúvida, um deles é Artur Malta, mais conhecido pelo apelido “Cabeção”, vivido por Sérgio Hondjakoff.

Foram nada menos do que seis temporadas (2000 a 2006), que lhe trouxeram fama, mas não uma garantia de ascensão na carreira, como aconteceu com Cauã Reymond, que construiu uma carreira de sucesso, André Marques e Bruno de Lucca, que também estiveram na novela teen, mas não deslancharam como atores.

Porém, ambos se reinventaram como apresentadores, o que não aconteceu com o intérprete de Cabeção, que acabou sumindo da televisão, além de ter tentado a carreira de cantor.

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Renata Sorrah – Nazaré Tedesco (Senhora do Destino)

Se Odete Roitman tem uma concorrente ao posto de vilã favorita na memória afetiva do público noveleiro, esta é Nazaré Tedesco, vivida de forma magistral por Renata Sorrah em Senhora do Destino (2004-2005).

Os incontáveis memes feitos com a sua figura que circulam atualmente pelas redes sociais foram, para a atriz, “transformadores”, pois fazem com que ela seja reconhecida em qualquer lugar pelos mais jovens, que não têm lembranças dos outros tantos papéis que a consagraram, especialmente a pintora alcoólatra Heleninha Roitman de Vale Tudo (1988-1989) e seu inesquecível “mambo caliente”.

“Foi uma vilã que eu amei fazer porque ela tinha humor. Ela era engraçada e se achava o máximo. Em toda dramaturgia, as vilãs são preciosas porque fazem a história andar. Fazer uma vilã é muito interessante”, explicou Renata durante entrevista ao Altas Horas em 2020.

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Entusiasta da história da televisão brasileira, Jonas Gonçalves é jornalista e pesquisador, sendo colaborador do TV História desde a sua criação, em 2012. Ao longo de quase 20 anos de profissão, já foi repórter, editor e assessor de comunicação, além de colunista sobre diversos assuntos, entre os quais novelas e séries Leia todos os textos do autor Leia todos os textos do autor