Muito antes do MasterChef, a Band já destacava a culinária em sua programação. Não, não estamos falando dos matinais como Cozinha Maravilhosa da Ofélia (1968), da inesquecível Ofélia Anunciato, ou o Dia Dia (2009), com Daniel Bork. Há exatos nove anos, 12 de dezembro de 2008, a emissora exibia o último capítulo de Água na Boca, folhetim clássico, açucarado como convém aos grandes romances, com a acidez proveniente de odiosos vilões e muito bem “empratado” pelo “chef” Marcos Lazarini (o autor). O TV História lista agora cinco motivos para sentir saudades desta boa novela – de audiência, lamentavelmente, pífia.
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Água e azeite
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Após um período de estudos na Europa, Danielle (Rosanne Mulholland) desembarca em Bento Gonçalves, Rio Grande de Sul, para ministrar aulas de gastronomia. Entre os alunos, o desajeitado Luca (Caetano O’Maihlan). Azeda como limão, a moça logo se indispõe com o rapaz, doce como mel – tanto que chega a ser enjoativo. Cenas depois, os dois participam da festa da colheita de uvas. E a atração, disfarçada de animosidade – em meio à guerra de farinha e tortas na cara -, vira romance. O que Dani não imagina é que Luca é descendente dos Bellini, família italiana, que instalaram a Pizzaria Mamma Mia no mesmo beco em que os Cassoulet, clã da mocinha, abriram o Bistrô Paris. As matriarcas Maria (Berta Zemmel) e Françoise (Jacqueline Laurence) eram amigas inseparáveis na infância; sabe-se lá por quê, o ódio minou qualquer relação. Os desempenhos deste quarteto – Rosanne, Caetano, Berta e Jacqueline – garantiram os melhores momentos do enredo; Dani e Luca eram protagonistas atípicos: irônicos e revanchistas, mas cheios de alegria e amor.
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Com açúcar, com afeto
Para turbinar esta versão culinária (e engraçadinha) de Romeu e Julieta, o autor preencheu os núcleos Bellini e Cassoulet com muito drama. Luca se torna arrimo de família após a morte do pai, Paolo (Carl Schumacher), em um incêndio criminoso que consome a pizzaria. Sua mãe, Manuela (Regina Remencius) não tem forças para recomeçar; o tio Guido (Renato Scarpin) é um boa-vida que passa o dia correndo atrás da esposa espevitada Fatinha (Paula Cohen); a avó Maria já padece com lapsos de memória, primeiro sintoma do Mal de Alzheimer. Do lado dos Cassoulet, além dos constantes desentendimentos entre Françoise e o marido Jean-Paul (Mário César Camargo), temos a crise financeira e conjugal de Phelippe (Jayme Periard) e Loulou (Ângela Figueiredo), pais de Dani e Renée (a promissora Priscila Sol, hoje no ar em Carinha de Anjo, do SBT), namorada de Zeca (Joaquim Lopes; ele mesmo, apresentador do Vídeo Show). Desta forma, o casal protagonista tinha muito a mais administrar do que suas atribuladas vidinhas amorosas.
Ingrediente surpresa
A princípio, apenas um ex-noivo inconformado com o término do relacionamento. Posteriormente, um vilão vingativo, com um único objetivo: destruir os Cassoulet e os Bellini. Assim era Alex (Alexandre Barros), neto de um nazista que, ao fugir para o Brasil, se viu condenado à prisão perpétua após a denúncia de suas vizinhas: as pequenas Maria e Françoise. Enquanto ele enreda Dani em sua teia, Luca se deixa envolver por Érika (Marisol Ribeiro), também chef, “melhor amiga” de sua amada. Ardilosa, a moça se ofereceu para apadrinhar a união de Alex e Dani e impôs Luca como seu par – pensem no sofrimento do rapaz, no altar, vendo sua queridinha casar-se com outro. Para não fugir de seu intento, o vilão rechaça qualquer proximidade com a esposa na cama. Resultado: quando Dani se descobre grávida, ninguém duvida que o filho é de Luca. Para surpresa do protagonista, sua grande amiga Gina (Miranda Kassin) desembarca em São Paulo, trazendo a tiracolo a filhinha dos dois, Allegra (Karen Tavares), que o auxilia a descobrir as armações de Alex e Érika.
Comendo com os olhos
Experimentando o HD – já testado na produção anterior, Dance Dance Dance (2007) -, a Band promoveu em Água na Boca um verdadeiro espetáculo gastronômico. Em slow, víamos pizzas saírem fumegando do forno da Mamma Mia; queijos fatiados e vinhos preenchendo taças no Bistrô Paris; profusão de cores de frutas, legumes e verduras no Mercado Municipal. Marcos Lazarini contou a assessoria do chef e roteirista Eduardo Duó; os “cozinheiros” do elenco participaram de workshops para aprender tudo sobre culinária, de como preparar um ovo frito ao manejo correto de facas e panelas. No elenco de apoio, garçons de verdade. Os diretores de arte Deborah Mesquita e Fernando Simões criaram restaurantes, empórios, uma réplica do Mercadão e o fictício Largo do Lourenço, onde se localizavam os estabelecimentos dos Bellini e dos Cassoulet. Ainda, duas cozinhas cenográficas com tudo funcionando e uma industrial, onde uma chef e um “food stylist” preparavam as iguarias vistas em cena. Apuro visual para aguçar o paladar do telespectador…
Temperos
Água na Boca também apostou no coentro, tão característico do cardápio nordestino, através do restaurante Baião de Dois, de Severino Penaforte (Cláudio Jaborandy) e sua esposa Miquelina (Ana Cecília Costa). Enquanto o filho Raimundo, o Raí (Renato Góes), dava a maior força aos pais, a herdeira Marinalva, ou Mari (Rayanna Carvalho) investia pesado para deixar seu reduto para trás. O alvo da carreirista: Reizinho (Gustavo Duque), o mimado filho de Cido (Henri Pagnoncelli), enteado de Guta (Elaine Mickely), de origem tão humilde quanto Severino e Miquelina. Ainda, o misterioso passado de Peterlongo (João Signorelli), mendigo de gosto refinado que acaba contratado do Bistrô Paris. Nascido em berço de ouro, Artur fugia do passado – inclusive de Keiko (Eda Nakagawa), a filha de Akira Mizoguchi (Ken Kaneko), que escondia do amado a filha que tiveram, Akemi (Juliana Kametani). Esta repete a trajetória da mãe ao engravidar do namorado Carlo (Celso Bernini), irmão de Luca.
Ainda, os irmãos Pimenta. Bertinho (Bethito Tavares) e Marta (Jerusa Franco), funcionários de uma barraca no Mercado Municipal. Por fim, o arrogante maître do ‘Paris’, Remy Pacheco (Marco Antônio Pâmio), contrastando com as alopradas “mammas” da pizzaria, Uni (Sílvia Poggetti), Duni (Mila Ribeiro) e Tê (Valéria Sândalo). Cabe ainda destaque para as participações de contratados da Band, como Raul Gil, Daniela Cicarelli e Ana Luiza Castro. E da cadeirante Tabata Contri, intérprete de Joana, baleada durante a fuga do então namorado Zico (Pierre Bittencourt), que se redime em razão da culpa que carrega pela condição física da moça: o tiro que a atingiu era para ele.