Algumas novelas da história da Globo fizeram muito sucesso, mas deram inúmeras dores de cabeça para a emissora, seja em relação à censura, ao elenco, problemas com autores e diretores ou com audiência.

Confira a lista que preparamos retratando 10 tramas que tiveram percalços em sua trajetória exitosa:

O Rei do Gado

O Rei do Gado

Sucesso indiscutível de Benedito Ruy Barbosa, O Rei do Gado deveria ter estreado após Explode Coração, mas houve um atraso na produção e a Globo precisou improvisar a exibição de O Fim do Mundo, novela com apenas 35 capítulos, para que a trama pudesse iniciar sua trajetória com folga.

A produção abordou temas espinhosos, como a reforma agrária, retratando o MST (Movimento dos Sem Terra), dois meses após o massacre em Eldorado dos Carajás (PA). O autor chegou a ser cobrado pela direção da Globo sobre a inserção do tema na história, prometendo abordá-lo com cautela.

Outro problema foi político: o senador Caxias (Carlos Vereza) fez um discurso emocionado no Congresso para apenas três políticos desinteressados. O fato suscitou protestos de outros senadores, como Ney Suassuna, que disse que aquilo era uma distorção da realidade e a cena induzia a população a acreditar que não havia senadores honestos no país.

O Bem-Amado

Primeira novela colorida da Globo, no ar em 1973, O Bem-Amado teve diversos problemas com a censura do regime militar da época. Um dos empecilhos foi a proibição do uso das palavras “coronel”, para se referir ao prefeito Odorico Paraguaçu (Paulo Gracindo), e “capitão”, como era chamado o bandido Zeca Diabo (Lima Duarte).

A produção teve que apagar o áudio de diversos capítulos já gravados. Palavras como “ódio” e “vingança” também foram vetadas. Até a música de abertura, “Paiol de Pólvora”, de Toquinho e Vinícius de Moraes, foi proibida.

Escrava Isaura

Sucesso de Gilberto Braga exibido entre 1976 e 1977, a novela também passou por diversos contratempos em virtude da censura. Em determinado momento, o autor foi proibido de usar a palavra “escravo” no texto.

Ele chegou a ir até Brasília (DF) para argumentar com os censores, mas não teve jeito. A solução encontrada foi substituir o termo por “peça”. A cena foi mostrada na minissérie Anos Rebeldes, também de Braga.

O Outro

Primeira novela-solo de Aguinaldo Silva, O Outro, de 1987, marcava a volta de Francisco Cuoco às tramas após cinco anos de ausência. Durante as gravações de um pesadelo, o ator quase se enforcou com uma corda. A estreia da novela foi adiada duas vezes por graves problemas de produção.

O saudoso Marcos Paulo, primeiro diretor-geral escalado pela emissora, saiu do circuito alegando cansaço. Os comentários na imprensa apontavam para uma desavença entre ele e a equipe de produção, que estaria boicotando o diretor.

Durante a trama, Lutero Luiz desfalcou as gravações ao ser acometido por uma hemorragia digestiva; já José Lewgoy saiu de vez. O ator se queixava da qualidade da novela; a produção dizia que ele desunia a equipe.

Na reta final, houve uma acusação de plágio por uma autora que participou da Casa de Criação Janete Clair, e acabou sendo feito um acordo – ela recebeu uma polpuda indenização.

O Salvador da Pátria

O motivo da dor de cabeça aqui foi político. O Salvador da Pátria contava a trajetória de Sassá Mutema (Lima Duarte), boia-fria analfabeto que chegava a ser eleito prefeito da cidade onde se passava a história. Na sinopse original, ele chegaria a ser Presidente da República, mas o autor Lauro César Muniz teve que mudar os planos.

A esquerda identificou no personagem traços de Luís Inácio Lula da Silva, e achava que o personagem era muito manipulável; já a direita, por sua vez, achava que a redenção de Sassá era uma propaganda indireta e subliminar a favor do candidato do PT.

No lugar da trama política, foi enfatizado o desbaratamento de uma rede de narcotráfico.

Rainha da Sucata

Primeira novela de Silvio de Abreu no principal horário da emissora, foi uma tentativa de levar o humor das sete para as oito. O que era uma grande comédia acabou virando um drama, com ajuda de Gilberto Braga, que colocou a novela em ordem, como contou o próprio Abreu ao livro Biografia da Televisão Brasileira.

Os núcleos dramáticos e cômicos foram bem separados e, a partir daí, a trama virou um sucesso. A emissora também passou por uma turbulência por conta de Pantanal, da Manchete, que não concorria diretamente com Rainha da Sucata, mas alavancou a grade da concorrente. Além disso, o Plano Collor também ajudou a aumentar a dor de cabeça do período.

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Laços de Família

Exibida entre 2000 e 2001, Laços de Família teve diversos contratempos durante sua trajetória. Existiu uma disputa judicial entre a Globo e a autora Solange Castro Neves por conta do título da novela – a emissora ganhou. Organizações moralistas e uma parcela do público questionavam a “glamourização” das garotas de programa, no caso das personagens Capitu e Simone.

Larissa Honorato, que vivia Nina, filha de Clara e Fred, foi substituída por Julia Magessi após sofrer um trauma psicológico, devido a gravação de uma cena de intensa discussão entre os seus pais da ficção. Por isso, o juiz Siro Darlan proibiu a participação de menores de 18 anos nas gravações, por conta de cenas de sexo e violência, e determinou a alteração do horário da novela, permitindo a exibição somente a partir das 21 horas. Posteriormente, a Globo fez um acordo e conseguiu reverter a decisão.

Laços de Família também enfrentou protestos do Departamento Nacional de Trânsito, após a cena em que Íris (Deborah Secco) dirige perigosamente pelas ruas do Rio de Janeiro. E o veto da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) às gravações da novela em qualquer uma de suas paróquias.

Para completar, o cantor João Gilberto quis processar a Globo por conta de o tema de abertura ter sido incluído na trilha sonora sem sua autorização. Mas, neste caso, a Som Livre já havia se entendido com a gravadora Universal.

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O Clone

Sucesso exibido pela Globo entre 2001 e 2002, O Clone já deu dor de cabeça para a Globo antes mesmo da estreia. A emissora ficou com receio da temática da novela ser rejeitada pelo público em virtude dos ataques terroristas aos Estados Unidos em setembro de 2001. A estreia, inclusive, foi adiada por um tempo.

Durante a produção, vários problemas atrapalharam a trama: quatro artistas contraíram dengue (Stênio Garcia, Reginaldo Faria, Elisângela e Marcello Novaes); Débora Falabella, a Mel, teve meningite virótica e precisou ficar internada por alguns dias; Ruth de Souza foi hospitalizada com pressão alta e Giovanna Antonelli torceu o pé durante uma gravação no Marrocos.

Como se não bastassem esses problemas, o ator Haylton Farias, que vivia o psicanalista de Lobato, levou uma facada no peito em uma briga com um vizinho e precisou deixar a obra.

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Mulheres Apaixonadas

Mulheres Apaixonadas

Outro sucesso de Manoel Carlos, Mulheres Apaixonadas teve alguns percalços de produção. A prefeitura do Rio de Janeiro (RJ) não queria permitir gravações de cenas de tiroteio no Leblon, bairro nobre da cidade. Setores do turismo protestaram contra o fato, temerosos de que o episódio reforçasse a imagem de insegurança do local. Mas o problema foi contornado e as tomadas foram feitas.

Além disso, a trama ficou marcada pela correria nos bastidores. Muitos capítulos foram gravados no mesmo dia em que seriam exibidos, porque os roteiros foram entregues aos atores com atrasos. A direção da emissora precisou interferir na questão para não atrapalhar o andamento da novela, com o empecilho enfim sendo resolvido.

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América

Novela de Glória Perez apresentada em 2005, América iniciou sua trajetória com muitos problemas, sendo massacrada pelo público e crítica, que apontava muitas falhas no roteiro. Além disso, houve um desentendimento entre a autora e o diretor de núcleo Jayme Monjardim, que acabou deixando a obra depois da exibição de 25 capítulos. A novela teve três aberturas diferentes, com dois temas musicais. E embalou somente após diversas mudanças em sua estrutura.

No final, houve uma discussão sobre a exibição do que seria o primeiro beijo gay entre dois homens das novelas, entre Júnior (Bruno Gagliasso) e Zeca (Erom Cordeiro). Apesar da expectativa do público, a cena foi gravada, mas não exibida, por decisão da direção da emissora. A primazia do fato coube à Amor à Vida, alguns anos depois.

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Thell de Castro

Apaixonado por televisão desde a infância, Thell de Castro é jornalista, criador e diretor do TV História, que entrou no ar em 2012. Especialista em história da TV, já prestou consultoria para diversas emissoras e escreveu o livro Dicionário da Televisão Brasileira, lançado em 2015 Leia todos os textos do autor