Rejeição e mudanças: os segredos da melhor novela de Manoel Carlos

Considerada por muitos a melhor novela de Manoel Carlos, Por Amor estreava há exatamente 24 anos, no dia 13 de outubro de 1997.

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Confira abaixo uma lista completa de curiosidades dos bastidores da exitosa produção da Globo:

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– Manoel Carlos formatou a sinopse de Por Amor em 1983. Mas o autor estava entristecido com o desfecho de sua trama anterior, Sol de Verão (1982): o protagonista Jardel Filho faleceu, vítima de um enfarte fulminante, e Maneco não teve condições emocionais de concluir o trabalho. Abalado, ele deixou a Globo. E Por Amor acabou na gaveta.

– A ideia veio de uma conversa entre amigos: Manoel Carlos citou uma frase de Balzac que dizia algo como “a abdicação de uma mãe ou é uma coisa monstruosa ou um ato sublime”. Os comentários do tipo “se o marido e o filho estivessem se afogando, a mãe joga a boia para o filho” e “marido não tem o mesmo sangue” influenciaram o novelista.

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– Neste primeiro tratamento, Eduarda (defendida por Gabriela Duarte em 1997) morria e Helena (de Regina Duarte), a mãe que havia trocado seu filho vivo pelo bebê morto da primogênita, se via diante de um grande dilema: contar ou não que o neto era seu filho. O desfecho planejado por Maneco apostava na manutenção do segredo: Marcelo (Fábio Assunção), o marido de Eduarda, se unia a Laura (Vivianne Pasmanter), abrindo mão da guarda do “filho”.

– A intenção, a princípio, era manter a morte de Eduarda. Mas a personagem acabou caindo nas graças do público – após se separar de Marcelo – e teve seu destino modificado. Como Manoel Carlos insistia em matar alguém no final, Laura acabou “sacrificada”. Os “passamentos” de Helena e Atílio (Antônio Fagundes), o pai da criança que a mãe dá à filha, também foram cogitadas.

– Enquanto ainda se falava no trágico fim de Eduarda, Maneco ensaiou abordar a nova lei de doação de órgãos: a jovem teria suas córneas transplantadas para a irmã Sandrinha (Cecília Dassi).

– Escalado para dirigir Corpo Dourado, às 19h, Ricardo Waddington foi remanejado para Por Amor, restabelecendo a bem-sucedida parceria com Manoel Carlos, já vista em História de Amor (1995). A produção implantou o folhetim em tempo recorde: Waddington assumiu o comando na última semana de agosto; a trama, como se sabe, estreou em 13 de outubro.

– Para facilitar a rotina de gravações, Gabriela Duarte voltou a morar com a mãe, Regina. Contracenar com a filha não foi tarefa fácil para a “namoradinha do Brasil”: nas primeiras cenas, a intérprete de Helena chegou a esquecer o texto. As duas já haviam experimentado o prazer de dividir o mesmo estúdio num breve passagem de Regina em Top Model (1989), na qual Gabriela vivia a adolescente Olívia.

– Ainda, a relação profissional do pai Manoel Carlos e da filha Júlia Almeida. Após figurar em Felicidade (1991) e História de Amor, Júlia, então com 14 anos, ganhava sua primeira personagem. O perfil de Natália, caçula dos emergentes Meg (Françoise Forton) e Trajano (Ricardo Petráglia), foi inspirado no filme As Patricinhas de Beverly Hills (1995).

– A pequena Cecília Dassi, que encantou o país com sua Sandrinha, estreou na TV em um episódio de A Comédia da Vida Privada (1995), Parece Que Foi Ontem, como filha de Marco Nanini e Marieta Severo. Contudo, foi sua atuação no Você Decide, em O Mundo Cão (1996), que garantiu sua participação em Por Amor.

– Eduardo Moscovis, sensação como o piloto de helicóptero Nando, defendia o “cabelão” do personagem – um homem de espírito livre, apaixonado por moto. Mas, como pilotos costumam manter os cabelos curtos, a produção intentou tesourar os fios. Moscovis então raspou as laterais, o suficiente para conseguir dar a impressão de ter as madeixas bem aparadas ao usar o boné que compunha seu uniforme. O diretor de núcleo, Paulo Ubiratan, acabou “ludibriado”. Assim, o ator convenceu o responsável pela trama de que Nando conseguiria driblar a vigilância dos patrões e manter os cabelos comprimidos.

– Nando fez tanto sucesso que seu intérprete se tornou campeão de cartas da Globo no período em que a novela esteve no ar. Vestindo o uniforme de piloto, fetiche de seu par romântico Milena (Carolina Ferraz) e do público, Du Moscovis acabou ganhando a capa da trilha internacional do folhetim.

– As figurinistas Beth Filipecki e Rosa Pierantoni, que contaram com a consultoria de moda de Silvinha de Souza, apostaram alto na feminilidade. As transparências dominavam o guarda-roupa de Helena, quase sempre em tons pastéis, seguindo uma tendência lançada pelas passarelas europeias. Já Márcia (Maria Ceiça) optava por uma linha étnica, com estampas pintadas à mão e sandálias de palha marroquina. Tênis coloridos compunham o figurino de Eduarda, que também era adepta do vestido com busto marcado – que ganhou as ruas. Por fim, Laura acompanhada de suas bolsas de ráfia, em tons de marrom, verde e vermelho.

– Antes do início das gravações, Françoise Forton acompanhou a socialite Vera Loyola em eventos sociais, para absorver o comportamento da musa inspiradora de sua Meg Trajano. Até Pepezinha, cadelinha de Vera, ganhou representação na ficção: a pug Inês possuía um tapete persa “sanitário”, assim como a “filhinha” de Loyola.

– Inês veio direto de Nova Iorque. E chegou a morar na casa de Françoise, enquanto o verdadeiro dono, um modelo, viajava para o exterior. A produção, que a contratou por R$ 1.200 por mês, viabilizou o encontro da cadelinha com Fadul Abdala, cão da mesma raça, de Jorge Amado e Zélia Gattai. Os cachorrinhos, que se casaram na ficção (uma sugestão de Amado a Maneco), também se relacionaram na “vida real”.

– Fábio Assunção também buscou orientação na alta sociedade. Ele acompanhou, de longe, o comportamento de Antenor Mayrink Veiga, então um jovem empresário recém-casado, tal e qual Marcelo.

– Já Murilo Benício estabeleceu um paralelo curioso entre seu personagem Léo, os alcoólatras e os portadores de Síndrome de Down. Das reuniões que frequentou no AA, à procura de inspiração, retirou a bondade existente em cada dependente, revelada quando admitem o vício. Dos portadores de síndrome, absorveu a sinceridade latente, quase ingênua.

– O laboratório de Maria Ceiça e Ricardo Macchi incluiu “trabalho braçal”: ela aprendeu a manipular argila e outros materiais, utilizados pela artista plástica Márcia, com o professor Paulo Vergueiro; já ele ficou duas semanas na floricultura do então chamado Projac, aprendendo a cuidar de um jardim, ofício de Genésio.

– O autor Manoel Carlos foi convencido pela diretora de arte Ana Maria Magalhães a fazer de Sirléia (Vera Holtz) a ex-miss Tatuí. Ele acreditava, a princípio, que os moradores locais pudessem se chatear com o comportamento da personagem; Vera, nascida na cidade, ajudou Ana Maria a demovê-lo desta impressão errônea.

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– O prédio na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, que servia de fachada para o edifício de Helena contava com uma moradora ilustre: Patrícia Pillar.

– O casamento de Eduarda e Marcelo foi gravado no Outeiro da Glória e mobilizou elenco e produção durante três dias, noites e madrugadas! Foi o próprio Maneco quem solicitou ao cardeal-arcebispo do Rio, Dom Eugênio Sales, autorização para gravar na Igreja Nossa Senhora da Glória.

– As gravações em Veneza, na Itália, eram constantemente interrompidas por conta dos turistas, que transitavam pelas ruas sem sequer notar a produção. Uma externa na Praça São Marco, por exemplo, precisou ser abortada por conta da captação de áudio, ineficiente em razão do alto número de pessoas papeando no local.

– O trem no qual Atílio parte para Londres, o Expresso Oriente, sequer saiu do lugar na cena em que o arquiteto se vai, deixando uma rosa para a apaixonada Helena. Sem ter como gravar a partida “real” da máquina – já que não haveria chance de repetir a sequência, caso algo saísse errado -, o diretor Paulo Ubiratan colocou Regina Duarte em cima de um carrinho de bagagem, puxado para trás pela produção enquanto a câmera permanecia estática ao lado do trem estacionado.

– Para o acidente de helicóptero que vitima Laura no antepenúltimo capítulo, a direção abriu duas frentes de gravação. A primeira no Projac, onde um helicóptero cenográfico foi lançado dentro de uma piscina – takes usados nas “tomadas fechadas” da queda -, e onde Eduardo Moscovis e Vivianne Pasmanter travaram os diálogos de Nando e da vilãzinha. A segunda, em Grumari, com Osvaldo Franco, piloto, e a dublê Denise Só substituindo os atores; Eduardo participou apenas das cenas do resgate de seu personagem.

– Uma das mais belas aberturas de todos os tempos, a vinheta de Por Amor não era necessariamente uma surpresa para Regina Duarte, que cedeu mais de 100 fotos para Hans Donner, responsável pelo trabalho. Mas ao ver na TV suas imagens se misturando às da filha, a atriz não conseguiu conter o choro. “Eu considero essa abertura a maior homenagem que eu já recebi na minha vida”, chegou a declarar na época.

– Hoje tratada como um grande sucesso, Por Amor registrou médias tímidas para uma novela das 20h. O primeiro capítulo registrou 48 de média; em novembro, quando Milena e Nando tomam um banho de mar (de roupas), o primeiro pico acima dos 50 pontos. A surra que Eduarda aplica em Flávia (Maria Zilda Bethlem), a amiga fura-olho de sua mãe, também turbinou a média: 51 pontos no momento do embate. Os índices cresceram com a gravidez de Laura: a tentativa da moça de contar tudo sobre sua gravidez para Eduarda chegou aos 54 de média. O recorde fica por conta do penúltimo capítulo, em 21 de maio de 1998: 58 pontos, com picos de 62 – e 57 no último.

– A edição se encarregou de “esfriar” o casal Nando e Milena: a primeira noite de amor sofreu cortes por conta da “alta voltagem” sexual; um banho a dois foi totalmente rifado de um dos capítulos.

– Intervenções também no perfil de Zito (Guilherme Corrêa), um apontador de jogo de bicho convertido em gerente do restaurante de Wilson (Paulo César Grande). A mudança partiu de uma orientação da Globo, que não julgava ético apresentar a ação de um contraventor no horário nobre.

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– Enquanto as novelas da época mantinha uma frente – intervalo entre as cenas gravadas e as que vão ao ar – de aproximadamente 12 capítulos, Por Amor contava com um intervalo de apenas dois dias entre o que era rodado e o que era exibido.

– Desta forma – desesperadora para a produção -, Maneco conseguia manter o diálogo “quente”, inserindo na boca dos personagens temas debatidos no Jornal Nacional daquela semana. Foi assim que Lídia (Regina Braga) pode comentar o embargo econômico dos Estados Unidos à Cuba, na época em que o Papa João Paulo II visitou a ilha, e o desmoronamento do edifício Palace II.

– Parte da “frente” foi perdida por conta dos capítulos esticados na edição para que a Globo evitasse o embate direto de sua linha de shows com o Ratinho Livre, atração de Carlos Massa na Record que, costumeiramente, chegava aos dois dígitos.

– Com a novela no ar até mais tarde, a vida noturna em bares e casas noturnas acabou prejudicada. Ângela Rô Rô, que estreava um espetáculo no Espaço das Artes, chegou a enviar 60 convites para o elenco de Por Amor; a presença das estrelas da TV na plateia acabaria por chamar público. Fátima Guedes, também em temporada no ‘Espaço’, precisou adiar o início de seu show para poder lotar a casa.

-Um “caco” de Carlos Eduardo Dolabella trouxe aborrecimentos para a direção: o texto de Manoel Carlos previa uma crítica velada a clubes de futebol transformados em “balcão de empregos, que compram até 90 jogadores”; o ator, contudo, citou nominalmente o Flamengo. Executivos do time atribuíram a fala à uma “campanha” de Dolabella por um novo dirigente. Diante do pedido de retratação, o autor inseriu uma frase no texto de Marcelo: “o Flamengo não comprou 90, mas 27 jogadores”.

– Já Eduarda virou alvo dos haters de uma então “recém-nascida” internet. Antes da estreia, Gabriela Duarte foi alertada por Maneco a respeito de uma possível rejeição à personagem, uma jovem ociosa, excessivamente mimada pela mãe Helena, que desprezava o pai Orestes (Paulo José) e não se opunha aos desmandos do noivo Marcelo e da sogra Branca (Susana Vieira).

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– Na página Eu Odeio a Eduarda, hospedada no Geocities, o internauta podia “matar” a mocinha – “clique aqui para dar um tiro na pentelha” – e lia depoimentos de “grandes personalidades” (como Homer Simpson, Papai Noel e o ET de Varginha) sobre o comportamento da moça. Ainda, um espaço para se comunicar com Manoel Carlos, através do e-mail fornecido pelo autor nas páginas da revista Contigo!, onde respondia cartas de telespectadores. Os estudantes de publicidade da UFRJ, Francisco Júnior e Cid Andrade, respondiam pelo site.

– Eduarda resistiu ao protecionismo da mãe e rompeu com a imagem de “mulher do lar” que parecia querer ostentar quando se casou com Marcelo. Traída, rompeu o relacionamento, retomado apenas no momento em que o empresário, arrependido por ter voltado aos braços da ex Laura, caiu em si e também adotou uma nova postura. Desta forma, acabou salva pelo público. A “sobrevivência” de Eduarda virou pauta até do programa de Hebe Camargo, no SBT; a apresentadora defendeu a vida da jovem.

– A Globo usou a mesma internet que “condenou” Eduarda para vender espaço publicitário nos capítulos de Por Amor. A emissora disponibilizou em seu site – numa ação inédita até então – um plano de merchandising, que vendia oportunidades de anúncio para empresas de materiais de construção e decoração de interiores, vistos no estúdio de Helena e Flávia (Maria Zilda Bethlem), e de produtos para bebê.

– Aliás, o envolvimento de Atílio e Flávia foi a alternativa encontrada por Manoel Carlos para movimentar a vidinha monótona do arquiteto. Pouco aproveitado, Antônio Fagundes queixou-se ao diretor de núcleo, Paulo Ubiratan, que levou a reivindicação ao novelista. O autor então precipitou o rompimento com Helena – ciente de que a mulher escondia algo acerca do nascimento de seu filho, ele a trai com sua sócia, numa espécie de “vingança”.

– Já a bissexualidade de Rafael (Odilon Wagner) só ganhou destaque nos meses finais, para evitar uma coincidência de temas com o folhetim das 19h, Zazá (encerrada em janeiro de 98). Na produção assinada por Lauro César Muniz, Marcos Breda vivia Ronaldo, bissexual caricato que se dividia entre a vida artística – travestindo-se de Carmem Miranda – e a paternidade, com o filho que teve com Mercedes (Louise Cardoso).

– A trilha sonora de Por Amor contou com temas de grandes nomes da música brasileira, nos vocais e nas letras. ‘Fora da lei’, com Ed Motta, era fruto de uma parceria do cantor com Rita Lee; composta por Zélia Duncan, ‘Às vezes nunca’ embalou os dramas de Laura, em versão instrumental e na voz de Verônica Sabino. Ivan Lins e seu parceiro constante, Vitor Martins, respondiam por ‘Mudança dos ventos’, que Nana Caymmi entoava nas cenas de Sirléia (Vera Holtz). Já ‘Paralelas’, letra de Belchior e gravação, de Elba Ramalho, figurou na trilha de Duas Vidas (1977), com Vanusa. E o tema de abertura, ‘Falando de Amor’, era uma composição de Tom Jobim, com MPB-4 e Quarteto em Cy.

– Reapresentada entre julho de 2002 e janeiro de 2003 – na sequência da bem-sucedida História de Amor -, Por Amor registrou índices que a aproximavam das tramas do horário nobre. Seu último capítulo chegou a 36 de média, enquanto Sabor da Paixão (18h) registrou 24, O Beijo do Vampiro (19h) bateu 25 e Esperança (20h), 33. Dados da Grande São Paulo.

– A novela também bateu recordes em Portugal, quando reapresentada pela versão lusitana do canal fechado GNT, em 2003.

– Em 2010, a novela inaugurou o horário das 16h30 do Viva. Tendo estreado junto com o canal, em maio, o folhetim chegou à liderança entre as atrações “da casa” em agosto. Líder entre o público feminino durante quase toda sua exibição, o folhetim entrou para o ranking dos dez mais vistos da TV paga em novembro, ranking tradicionalmente ocupado por programas esportivos e infantis. Em maio de 2017, o Viva deu início à reexibição de Por Amor, a primeira “re-reprise” do canal, novamente com sucesso.

– Por fim, a novela foi novamente exibida no Vale a Pena Ver de Novo entre abril e outubro de 2019, com o mesmo êxito das reprises anteriores.

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