Nicette Bruno deixa um legado inestimável: mais de 75 anos de dedicação às artes

20/12/2020 às 13h44

Por: Nilson Xavier
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Com imenso pesar, recebemos neste domingo (20) a notícia do falecimento da atriz Nicette Bruno, mais uma vítima do Covid-19. Já estive com Nicette em coletivas de televisão e já a vi no teatro, mas nunca conversamos: nunca tive a oportunidade de dizer-lhe que eu, criança em 1977, amava a Dona Lola, sua personagem na novela Éramos Seis da TV Tupi.

A atriz, de 87 anos, estava internada na Casa de Saúde São José, no bairro Humaitá, no Rio de Janeiro (RJ), desde o dia 29 de novembro, quando testou positivo para Covid-19.

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NICETTE BRUNO NA NOVELA A VIDA DA GENTE, 2011 (ACERVO TV GLOBO)

Nicette sai de cena aos 87 anos, deixando um legado inestimável de, pelo menos, 75 anos de carreira, em mais de 50 peças, 11 filmes e mais de 60 participações na televisão, entre novelas, séries, minisséries e outros programas. Premiadíssima no teatro, TV e cinema, a atriz foi consagrada pelo grande público por meio da televisão, veículo em que esteve muito presente nos últimos cinquenta anos, em vários papeis marcantes e inesquecíveis.

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Nicette Bruno conquistou gerações, a minha e a sua (se você não for muito mais velho que eu). Crescemos assistindo-a em novelas, com sua interpretação cativante e sorriso doce. Até mesmo quando deu vida a vilãs ou personagens amargas. É que Nicette raras vezes foi vista nesses papeis. Era sempre a mãe zelosa, a vizinha curiosa, a madre compreensiva ou a mulher espirituosa. No máximo foi a rabugenta divertida, como na novela Órfãos da Terra, um de seus últimos trabalhos.

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Nicete Xavier Miessa nasceu em Niterói, em 7 de janeiro de 1933. Filha de Sinésio Campos Xavier e da atriz Eleonor Bruno, desde criancinha esteve envolvida com as artes: declamava, cantava e dançava, tendo tido aulas de piano, balé e teatro. Aos 12 anos (em 1945) estreou profissionalmente em uma montagem de “Romeu e Julieta”. Aos 14, entrou para a famosa companhia de teatro de Dulcina de Morais.

Em 1952, durante a peça “Senhorita Minha Mãe“, Nicette conheceu Paulo Goulart, parceiro de palco. Apaixonaram-se e casaram dois anos depois. Eles tinham a mesma idade, 21 anos quando casaram. Nicette era dois dias mais velha que Paulo (ele nasceu em 9 de janeiro de 1933). Juntos, tiveram três filhos, que seguiram a carreira artística: Bárbara Bruno, Beth Goulart e Paulo Goulart Filho. Foram 60 anos de um dos casamentos mais celebrados no meio artístico (Paulo faleceu em 2014). Os casal era, há mais de quarenta anos, adepto da Doutrina Kardecista.


NICETTE BRUNO COM A FAMÍLIA NOS ANOS 1970

Já em sua adolescência, Nicette participou de peças importantes, como “Anjo Negro”, de Nelson Rodrigues, e “O Fantasma de Canterville”, de Oscar Wilde. Em 1953, fundou com o marido a companhia Teatro Íntimo Nicette Bruno (TINB). Durante as décadas de 1950 e 1960, Nicette fez parte de quase todas as principais companhias de teatro brasileiras. Em 1962, ela e Paulo foram morar em Curitiba, onde lecionaram artes cênicas no Teatro Guaíra e participaram do Teatro de Comédia do Paraná (TCP), no qual produziram diversas montagens.

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Pioneira da televisão, Nicette participou, no início da década de 1950, de teleteatros na recém-inaugurada TV Tupi. Outro trabalho marcante foi na TV Continental, em 1959, como protagonista do seriado Dona Jandira em Busca da Felicidade, que era exibido ao vivo (ainda não existia videoteipe). A primeira novela diária e em videoteipe foi Os Fantoches, de Ivani Ribeiro, em 1967, na TV Excelsior. Na emissora, a atriz emendou mais três novelas: A Muralha, Legião dos Esquecidos e Sangue do Meu Sangue.


NICETTE BRUNO COM GIANFRANCESCO GUARNIERI EM A MURALHA (1968) | EM COMO SALVAR MEU CASAMENTO (1979)

Em 1970, Nicette retornou à Tupi, na novela A Gordinha, vivendo a protagonista Mônica. Na emissora, permaneceu por dez anos, até a Tupi encerrar suas atividades (em 1980), com destaque para as novelas O Meu Pé de Laranja Lima (1970), Camomila e Bem-Me-Quer (1972), Rosa dos Ventos (1973), As Divinas e Maravilhosas (1973), Éramos Seis (1977) e Como Salvar Meu Casamento (1979-1980) – novela que, com o fim da Tupi, ficou inacabada.


NICETTE BRUNO COM GIANFRANCESCO GUARNIERI EM ÉRAMOS SEIS (1977) | NO SÍTIO DO PICAPAU AMARELO (2001)

Em 1981, Nicette migrou para a Globo, participando do seriado Obrigado Doutor. Em 1982, fez sua primeira novela na emissora carioca: Sétimo Sentido, de Janete Clair.


NICETTE BRUNO EM ÓRFÃOS DA TERRA (2019) | EM SÉTIMO SENTIDO (1982)

Foram mais dezoito novelas completas e outras tantas participações, com destaque para as personagens Isolda de Louco Amor (1983); Fanny do remake de Selva de Pedra (1986); Branca de Bebê a Bordo (1988); Neiva de Rainha da Sucata (1990); Juju do remake de Mulheres de Areia (1993); Nina de A Próxima Vítima; Úrsula de O Amor Está no Ar (1997), uma de suas raras vilãs; Judite de Andando nas Nuvens (1999); Ofélia de Alma Gêmea (2005), outra rabugenta divertida; Iná de A Vida da Gente (2011), um de seus melhores papeis; Izabelita de I Love Paraisópolis (2015); e Ester de Órfãos da Terra (2019).


NICETTE BRUNO EM MULHERES DE AREIA (1993) | EM ALMA GÊMEA (2005)

Em 2014, Nicette estreou a peça “Perdas e Ganhos”, monólogo da escritora Lya Luft com direção da filha da atriz, Beth Goulart, em homenagem ao marido falecido, Paulo. Em 2016, a atriz atuou na peça “O Que Terá Acontecido a Baby Jane?” ao lado de Eva Wilma. Em 2020, antes da pandemia de Covid-19, encenou outro texto famoso: “Quarta Feira Sem Falta Lá em Casa“, dividindo o palco com Suely Franco.

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Ainda na televisão, Nicette foi a Dona Benta do Sítio do Picapau Amarelo, entre 2001 e 2004. Sua última aparição na TV foi em março de 2020, em uma pequena participação, mas especialíssima: como uma madre na versão da Globo de Éramos Seis, contracenando com Glória Pires e Irene Ravache, outras Lolas da história de Maria José Dupré – tal qual Nicette fora na Tupi nos anos 1970, personagem que guardo com carinho em minha memória afetiva.


NICETTE BRUNO COM GLÓRIA PIRES EM ÉRAMOS SEIS (2020)

Uma das mais queridas atrizes, tanto pelo público quanto por colegas de profissão. Para sempre ficarão guardados em nossa lembrança seu olhar e sorriso cativantes estampados em tantas personagens que acompanhamos ao longos dos anos. Também sua sabedoria, posicionamentos firmes e palavras fraternais externados em várias entrevistas. Nicette foi muito especial e, creio, continuará sendo.

SOBRE O AUTOR
Desde criança, Nilson Xavier é um fã de televisão: aos 10 anos já catalogava de forma sistemática tudo o que assistia, inclusive as novelas. Pesquisar elencos e curiosidades sobre esse universo tornou-se um hobby. Com a Internet, seus registros novelísticos migraram para a rede: no ano de 2000, lançou o site Teledramaturgia, cuja repercussão o levou a publicar, em 2007, o Almanaque da Telenovela Brasileira.

SOBRE A COLUNA
Um espaço para análise e reflexão sobre a produção dramatúrgica em nossa TV. Seja com a seriedade que o tema exige, ou com uma pitada de humor e deboche, o que também leva à reflexão.

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